sábado, 21 de setembro de 2013

ESTUDO A PARTIR DE ZACARIAS 1.5.




Vossos pais, onde estão eles? E os profetas, vivem para sempre?” (Zc 1.5).


Zacarias, filho de Baraquias, filho de Ido, foi um sacerdote contemporâneo do profeta Ageu, formando com este uma dupla de profetas que, no período pós-exílico, exortou o povo a reconstruir o Templo em Jerusalém, que havia sido destruído por Nabucodonosor, rei da Babilônia.
Esdras menciona Zacarias em seu Livro (5.1; 6.14).
Em 520 a.C., Zacarias deparou com o esfriamento espiritual do povo judeu, 16 anos após as primeiras levas de judeus terem retornado à Terra Prometida. Era a época da restauração do Templo, mas o povo estava entorpecido. Haviam-se esquecido de que Deus usara o próprio Imperador Ciro para decretar o retorno a Jerusalém. Haviam-se esquecido de sua própria História.
Leia, por favor, Zc 1.1-6. A profecia começa com uma palavra contundente sobre a ira extrema do SENHOR, um conceito negligenciado em nossos dias, quando Deus é visto como um deus impessoal, um deus condescendente, um "bom velhinho", e confundido com o sentimento de amor - quando, na verdade, Deus é amor (I Jo 4.8), mas não deve ser confundido com o amor. Dito de outro modo, Deus é amor, mas o amor não é Deus.
Vale aqui citar uma declaração do escritor irlandês C.S. LEWIS sobre a ira de Deus:

"Deus é o único conforto, mas Ele é também o terror supremo: Ele é Aquele de quem mais precisamos e Aquele de quem mais nos escondemos. Ele é o nosso único aliado possível, contudo nós nos tornamos Seus inimigos. Alguns falam como se encontrar o olhar da bondade absoluta fosse ser fácil. Eles precisam parar para pensar melhor. Eles ainda estão brincando de religião. A Bondade é tanto a melhor segurança quanto o maior perigo - isso depende de como reagimos a ela. E temos reagido da forma errada."

O Cativeiro Babilônico, que durou 70 anos, fora profetizado, e consistiu em juízo de Deus. Pela ação do próprio SENHOR da História, o Império Medo-Persa sucedeu o Império Babilônico e permitiu que os judeus retornassem à sua terra e reconstruíssem o Templo.
Como Zacarias afirma, houve arrependimento no passado, quando os judeus entenderam que o Cativeiro era juízo divino. Mas a conversão é pessoal. Eles vieram a morrer, e caberia aos seus descendentes crer em Deus e se arrepender.
Os “pais” a que Zacarias se refere são os antepassados, as gerações anteriores, os antigos, os mais velhos. Já os "profetas" são os pregadores, os mensageiros, os porta-vozes de Deus. Os pais experientes morreram, mas Zacarias apela para que os vivos atentem para a experiência deles. Os profetas morreram, mas Zacarias apela para que os vivos atentem para a mensagem deles, que continua viva.
Os experientes morrem, mas a experiência deve ser lembrada.
Os mensageiros morrem, mas a mensagem permanece.
Ao longo dos séculos, Deus interveio e promoveu muitos avisos para a Humanidade, para Israel e para a Igreja. É importante considerar o legado histórico, sem o que se cometem os mesmos erros do passado.
Lemos em Ex 1.8: “Entrementes, se levantou novo rei sobre o Egito, que não conhecera a José”. Por não conhecer a História, Faraó oprimiu o povo de Deus, mas os próprios egípcios amargaram depois as consequências disso, com as manifestações divinas na forma das "Dez Pragas".
Em Am 3.7 está escrito: “Certamente, o SENHOR não fará coisa alguma, sem primeiro revelar o seu segredo aos seus servos, os profetas. Os homens de Deus não são surpreendidos, porque há um plano, um propósito, uma linha de ação do próprio Deus. A Igreja é depositária das palavras do SENHOR.
Em Lc 17.32 Jesus disse: “Lembrai-vos da mulher de Ló”. Assim como nesse trecho, Jesus fez duras advertências tomando por base a História, o que aponta para o fato de que Deus chancela a relevância do legado histórico.
O apóstolo Paulo deu grande ênfase à transmissão da Palavra de Deus, tal como ela é, sem acréscimos nem supressões. Paulo refere-se ao que conhecemos como "Antigo Testamento" (Lei, Profetas e Escritos), reconhecendo-lhe a finalidade de exemplo e advertência. Vejamos:

Ora, estas coisas se tornaram exemplos para nós, a fim de que não cobicemos as coisas más, como eles cobiçaram (...) “Estas coisas lhes sobrevieram como exemplos e foram escritas para advertência nossa, de nós outros sobre quem os fins dos séculos têm chegado” (I Co 10.6,11).

Paulo deixa claro que ele anunciou o que recebeu, como uma tradição, no melhor sentido do termo. Confira-se:


Irmãos, venho lembrar-vos o evangelho que vos anunciei, o qual recebestes e no qual ainda perseverais; por ele também sois salvos, se retiverdes a palavra tal como vo-la preguei, a menos que tenhais crido em vão. Antes de tudo, vos entreguei o que também recebi...” (I Co 15.1-3, primeira parte).

“Porque eu recebi do SENHOR o que também vos entreguei” (I Co 11.23).

Da mesma maneira, os pastores devem transmitir a palavra recebida, e entender que há um depósito e um padrão a ser, respectivamente, preservado e observado:

 “E o que de minha parte ouviste através de muitas testemunhas, isso mesmo transmite a homens fiéis e também idôneos para instruir a outros"  (I Tm 2.2).
 
“E, por isso, estou sofrendo estas coisas; todavia, não me envergonho, porque sei em quem tenho crido e estou certo de que ele é poderoso para guardar o meu depósito até aquele Dia. Mantém o padrão das sãs palavras que de mim ouviste com fé e com o amor que está em Cristo Jesus. Guarda o bom depósito, mediante o Espírito Santo que habita em nós” (II Tm 1.12-14).
 Não se deve desprezar a experiência. Vejamos o que escreveu o autor da Epístola aos Hebreus:

 “Lembrai-vos dos vossos guias, os quais vos pregaram a palavra de Deus; e, considerando atentamente o fim da sua vida, imitai a fé que tiveram” (Hb 13.7).

"Guias" são os pastores. Feliz daquele que tem referenciais em sua vida, que pode dizer que conheceu homens de verdade, pessoas de fé verdadeira.
Imitar a esses homens é valioso e recomendado (cf. I Co 4.16; 11.1; Fp 3.17).
Reflita, agora, sobre o seguinte texto:


           Portanto, também nós, visto que temos a rodear-nos tão grande nuvem de testemunhas, desembaraçando-nos de todo peso e do pecado que tenazmente nos assedia, corramos, com perseverança, a carreira que nos está proposta, olhando firmemente para o Autor e Consumador da fé, Jesus, o qual, em troca da alegria que lhe estava proposta, suportou a cruz, não fazendo caso da ignomínia, e está assentado à destra do trono de Deus. Considerai, pois, atentamente, aquele que suportou tamanha oposição dos pecadores contra si mesmo, para que não vos fatigueis, desmaiando em vossa alma” (Hb 12.1-3).

 Diferentemente do que já ouvimos em algum lugar, essas "testemunhas" referidas no Texto Sagrado não são as pessoas que nos cercam, mas os personagens da chamada "Galeria dos Heróis da Fé", registrada no Cap. 11 de Hebreus, imediatamente anterior ao capítulo em que o texto se encontra.   O testemunho da Galeria dos Heróis da Fé deve nos encorajar a seguir adiante. Devemos olhar o passado para trilhar na carreira que nos está proposta. Se nossos irmãos conseguiram, nós podemos conseguir, em Cristo. É nesse sentido que aquelas "testemunhas" nos incentivarão.
Observe que tradição difere de tradicionalismo. Alguém disse, com acerto: "Tradição é a fé viva dos mortos. Tradicionalismo é a fé morta dos vivos". Fiquemos com a tradição cristã, bíblica e apostólica.
Essas considerações são urgentes nos tempos que vivemos, a que filósofos e teólogos denominam Pós-modernidade ou até Hiper-modernidade.
Seguem algumas características da Pós-modernidade, e que se infiltram nas igrejas evangélicas brasileiras, por meio da Teologia da Prosperidade (Confissão Positiva e Triunfalismo) e de outros modismos, mas sempre a partir de influências estranhas e irmanadas com o espírito da nossa época:
1) SOMENTE O QUE FOR NOVO:
Vivemos a cultura do descarte, do desprezo pela História, pela experiência e pela tradição. Todos querem a novidade, o novo, o que está na moda, “o último tipo”. 
Na verdade, nem isso é novo, pois, como escreveu Salomão, "nada há novo debaixo do sol" (Ec 1.9). Em Atenas, Paulo deparou com os filósofos estoicos e epicureus, que nada faziam além de discutir as últimas novidades (At 17.21).
Em virtude da internet e das muitas tecnologias de difusão de conteúdos, dizem que essa é a era do conhecimento, mas o que se vê é a era da informação desorganizada. 
Todo mundo pode consultar tudo em qualquer lugar, mas as informações saem desordenadamente, e as vozes são muitas e desencontradas. 
Faltam referências, faltam princípios, falta um sistema.
Enquanto isso, falsos líderes adentram as igrejas pregando "o novo", para deleite dos que rejeitam as coisas antigas.

2) SOMENTE O QUE FOR P'RA JÁ:
Vivemos a época do imediatismo. As pessoas querem obter resultados fáceis e rápidos. As pessoas querem “dar um enter” e receber bençãos e respostas. É a cultura do fast food.
É comum ouvirmos pregadores chamarem as pessoas à frente para receberem a bênção "nesta noite". Esquecem que a vida cristã é mais tendente ao processo do que ao imediato.

3) SOMENTE O QUE FOR DO MEU JEITO:
Vivemos o subjetivismo e o pluralismo: em lugar da adoração a Deus, cada um enaltece a si mesmo (subjetivismo) e crê da maneira que lhe apraz, o que conduz ao aparecimento de uma pluralidade de crenças e práticas, conforme o gosto do "cliente" (pluralismo). Eis a cultura do self-service. 
 Muitas pessoas frequentam igrejas de acordo com suas ideias e preferências, misturando o que cada igreja oferece. A partir de variados aspectos de igrejas distintas, projeta-se uma igreja peculiar e "ideal".
Criam-se deuses à imagem do Ser Humano.

4) SOMENTE O QUE FOR SEM COMPROMISSO:
Vivemos a época da superficialidade, da luta contra as instituições, da ausência de aprofundamento nas relações interpessoais, de uma espiritualidade sem líderes.
Conceitos como doutrina, autoridade e disciplina são deixados de lado.
“Campanhas” substituem o compromisso congregacional. Pregadores da TV e da internet substituem o pastor. Criam-se estilos de ser crente ou gospel ao gosto do freguês.
Fala-se em termos próximos à autoajuda e ao autoconhecimento, mas isso nada tem que ver com Redenção em Cristo.

5) SOMENTE O QUE ME DER RETORNO:
Vivemos a época do mercantilismo da fé, da lei da semeadura financeira.
As pessoas querem poder (financeiro, corporal, espiritual), querem o "elixir da juventude" para que não precisem do Filho de Deus, que oferece a vida eterna. E nas igrejas há quem aprecie muito as coisas do mundo, não tendo, porém, a certeza da Salvação.
Promessas vazias são feitas como se Deus as houvesse transmitido, e histórias são concebidas pela mente humana para se passarem como palavras do SENHOR, a fim de propiciar o comércio da fé (Leia II Pe 1.16; 2.3).
Precisamos de História, referências, modelos, parâmetros, liderança, tradição cristã. Precisamos de uma Herança de Fé.
Precisamos urgentemente da Palavra do SENHOR, que permanece para sempre (Lc 21.33).


1 Estudo ministrado em culto na Igreja Batista da Reconciliação, liderada pelo Pr. ARTUR SANTANA no Bairro de Mussurunga, em Salvador/BA, no dia 21 de setembro de 2013, onde também tivemos a honra de conhecer irmãos da Comunidade Cristã Vida Eterna, que se reúne na Boca do Rio.

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