Ev. Alex Esteves da Rocha Sousa
O mundo animal é frequentemente lembrado quando se buscam metáforas para os atributos da natureza humana. Daí nascem as fábulas e prosopopeias, onde animais se portam como pessoas, a exemplo de enredos dos Contos de Grimm, além de inúmeros desenhos animados. A literatura moderna também se abebera dessa fonte. Em A Revolução dos Bichos, George Orwell emprega uma fábula para narrar, com maestria, a trajetória de regimes socialistas totalitários. Lá estão porcos, galinhas, cavalos, cães, mas a história é sobre o Homem.
Tal recurso literário não escaparia à Bíblia, na qual se apresentam as figuras semânticas do leão, da ovelha, do bode, do cordeiro, da pomba, dos porcos, dos cães, dos lobos… em meio a uma miríade de tantas outras ilustrações da maior riqueza e significado ético, moral, espiritual e escatológico.
Assim, Jesus é “o Leão da Tribo de Judá”, mas o diabo anda “em derredor, bramando como leão, buscando a quem possa tragar”; os crentes são chamados de “ovelhas”; o Messias dirigiu-se à Cruz como “cordeiro levado ao matadouro”; o discípulo de Cristo deve ser “símplice como as pombas e prudente como as serpentes”; uma pomba descida sobre a cabeça de Jesus simbolizou (e corporificou) o Espírito Santo.
Os porcos, de modo geral, são biblicamente ligados à noção de imundície; os bodes são associados à agressividade e rispidez; falsos líderes são como “lobos devoradores” e “cães”; aquele que volta ao pecado é como “a porca lavada [que volta] ao espojadouro de lama”, ou como “o cão [que voltou] ao seu próprio vômito”.
Jesus referiu-se a Herodes como “aquela raposa” em razão da disposição deste para o ardil; João Batista chamou os fariseus de “raça de víboras” porque a conduta deles era inteiramente reprovável; o diabo é “a antiga serpente”, não apenas porque incorporou uma serpente para tentar a mulher, mas porque serpentes são insidiosas; o mesmo diabo é o “dragão” por ser destruidor, monstruoso, homicida.
Toda essa peroração serve para assentar que me espanta a possibilidade de denominados “pastores” agirem como bodes, porcos, lobos, raposas, cobras ou cães, o que acontece eventualmente quando são agressivos, imundos, vorazes, ardilosos, insidiosos ou gritalhões: agressivos como bodes cuja cara já assusta de longe; imundos como porcos que se satisfazem, juntos, no erro; vorazes como alcateia que destrói a presa em segundos; ardilosos como raposas cujas intenções nunca são conhecidas; gritalhões como cachorros que, em matilha, partem ladrando para vencer pela força.
Esses indivíduos que emulam características animalescas são menos dignos do que os próprios animais, porque estes, agora gemendo pelos efeitos da Queda, aguardam, “com ardente expectação”, a “manifestação dos filhos de Deus” - e o que esses homens esperam? São esses indivíduos menos dignos do que os animais cujos atributos macaqueiam, pois na Arca de Noé entraram todos os animais, conforme determinação divina - e desses homens… se poderá dizer que entrarão na Arca da Salvação?
Somente ovelhas participam do rebanho do Sumo Pastor e Bispo de nossas almas - os bodes ficarão de fora, ainda que cobertos das lãs do simulacro. Somente pintainhos são albergados sob as asas da galinha que, amorosa, os pretende livrar de todo mal.
Os representantes da maldade reunir-se-ão, isto sim, na “Grande Ceia de Deus”, a ceia dos animais, uma das ceias apocalípticas, em que a carne dos poderosos será dilacerada pelas aves. Aliás, presentemente os tais que são falsos profetas e falsos cristos já reúnem multidões, porque “onde estiver o cadáver, aí se ajuntarão os abutres”.
Pastores que ladram mordem, e não são pastores. São mercenários, salteadores, abusadores espirituais, arrombadores da inocência e aproveitadores da ambição alheia. Jamais, em tempo algum, devemos admitir que pastores se comportem como animais irracionais, bestas indecentes, cobras peçonhentas, pragas de plantações. Devemos, na verdade, arrancar as ovelhas da boca desses leões famintos, para salvar, quem sabe, “as duas pernas ou um pedaço da orelha”.
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