sábado, 16 de maio de 2015

Lendo "Da Liberdade Cristã", de Martinho Lutero (1)

Pretendo dar maior atenção aos livros de que disponho, e um modo bastante enriquecedor e estimulante é resenhá-los, na medida do possível, e publicar essa resenha (crítica) na internet. Falta-me tempo, muitas vezes falta disposição, mas não me falta o interesse.
Decidi começar por um livro pequeno no tamanho, mas de grande valor em seu conteúdo: Da Liberdade Cristã, do reformador alemão Martinho Lutero, com suas ricas 48 páginas publicadas pela Editora Sinodal no ano de 1998, em 5ª edição.
Antes, porém, gostaria de pontuar mais algumas coisas. Há razões importantes para que estudemos Da Liberdade Cristã:
a) tem-se percebido, no Brasil e no mundo, crescente interesse pelas Doutrinas Reformadas, o que Augustus Nicodemus Lopes (1), em exposição divulgada no Youtube (2), associou ao chamado "Neocalvinismo" ou "Novo Calvinismo. Conquanto Luteranismo e Calvinismo sejam correntes distintas da Herança Reformada, Da Liberdade Cristã trata da salvação pela graça mediante a fé, algo que está no cerne do pensamento de Calvino;
b) esse recente interesse por autores reformados tem se acentuado entre cristãos pentecostais, especialmente jovens, que andam lendo, ouvindo e citando, por exemplo, John Piper, Paul Washer e o próprio Nicodemus;
c) é necessário conhecer os fundamentos, e Martinho Lutero tem a autoridade de quem divulgou, no dia 31 de outubro de 1517, as célebres 95 Teses!
Dito isso, passo ao livro, cuja tradução ficou a cargo de Walter Altmann (3), autor também do Prefácio, que resumirei a seguir:
De acordo com Altmann, Martinho Lutero redigiu duas versões dessa obra, uma em latim e outra em alemão.
A versão em latim foi publicada em português em 1989 no volume 2 das Obras Selecionadas, pelas Editoras Sinodal e Concórdia. 
A versão alemã foi a primeira obra de Lutero editada em português pela Sinodal, em 1959. Houve outras três edições antes dessa 5ª edição ora resenhada, as quais tinham a tradução de Leônidas Boutin e Heinz Soboll, com auxílio de Richard Wangen.
Optou-se por uma nova tradução do texto original, seguindo a edição crítica constante da WA 7.20-38 (4).
Walter Altmann observa que o título mais correto seria Acerca da liberdade da pessoa cristã - Von der Freiheit eines Christenmenschen -, sendo Da Liberdade Cristã derivado da versão latina, mas se resolveu manter o título há muito difundido no Brasil.
Altmann inicia o Prefácio afirmando que Da Liberdade Cristã deve ser "um dos mais importantes, senão o mais importante, dentre a volumosa obra escrita do Reformador Martim Lutero" (p. 3). Para endossar essa afirmação, cita o depoimento de Leonardo Boff (5), segundo o qual a obra é "um dos mais belos textos da tradição cristã" (p. 3).
Continua o Prefácio anotando que Lutero escreveu Da Liberdade Cristã no fim de 1520, já ameaçado de excomunhão pela Igreja Católica Romana e sob pedido de extradição dirigido ao Príncipe-Eleitor Frederico, o Sábio. 
Por sugestão sponte propria do emissário papal, Carlos von Miltitz, Lutero enviou o livro ao Papa Leão X com uma carta em tom pessoal, o que não lhe impediu a excomunhão no início de 1521 nem a proscrição do Império, alguns meses depois, pela Dieta de Worms.
Observo que, se o Papa Leão X chegou a ler o livro, a excomunhão e condenação de Lutero podem ser explicadas pelo fato de que o reformador protestante deixou ali registradas críticas severas ao sistema católico-romano, como será demonstrado oportunamente.
Nas palavras de Walter Altmann:
"Neste escrito Lutero expõe sua doutrina central de como o ser humano, em Cristo, é livre por ter sido justificado gratuitamente por Deus, mediante a fé, não carecendo para sua salvação de nenhuma obra própria. Com igual ênfase, porém, explicita como essa liberdade cristã leva inevitavelmente a incessantes boas obras, como disciplina do corpo e como serviço livre em favor do próximo, visando tão-somente a suprir necessidades deste" (p. 4).

Assim, temos aqui a discussão fundamental sobre a relação entre Fé e Obras e sobre a justificação pela fé somente. 
Continuaremos oportunamente.

(1) Augustus Nicodemus Gomes Lopes, paraibano, é pastor e teólogo presbiteriano, é ex-Chanceler da Universidade Presbiteriana Mackenzie e autor de diversos livros, como O que estão fazendo com a Igreja? Atualmente pastoreia a Igreja Presbiteriana de Goiânia.

(2) Disponível em https://www.youtube.com/watch?v=tmdvbeczK7o

(3) Walter Altmann é ministro e teólogo luterano. À época da edição em comento ocupava o cargo de Presidente do Conselho Latinoameriano de Igrejas (CLAI). Presidiu a Igreja Evangélica de Confissão Luterana no Brasil de 2002 a 2010, e foi professor na Escola Superior de Teologia (EST), em São Leopoldo/RS, entre 1974 e 2002 (informações da Wikipédia: http://pt.wikipedia.org/wiki/Walter_Altmann).


(4) Weimarer Ausgabe (WA) ou D. Martin Luthers Werke: kritische Gesammtausgabe é uma edição crítica completa da obra escrita ou verbal, em latim ou alemão, de Martinho Lutero (informações da 
Wikipédia: http://en.wikipedia.org/wiki/Weimar_edition_of_Martin_Luther%27s_works).

(5) Realmente não sei por que motivo Leonardo Boff seria o mais autorizado a testemunhar em favor da obra do reformador protestante, mas as preferências teológicas e ideológicas de líderes luteranos brasileiros me fazem imaginar que isso decorra do alinhamento com a Teologia da Libertação, que entre os evangélicos adota o nome "Teologia da Missão Integral" ou simplesmente "Missão Integral". Esse é uma questão lateral neste momento, embora eu deva registrar que a Teologia da Libertação e a Teologia da Missão Integral sejam uma mistura naturalmente contraditória de Marxismo e Cristianismo.





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Na pecaminosidade do homem, e que somente o arrependimento e a fé na obra expiatória e redentora de Jesus Cristo é que pode salvá-lo.
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