Ontem e hoje o corpo da Irmã Dulce, falecida em 1992 aos 77 anos, esteve exposto à visitação pública na Igreja da Imaculada Conceição da Mãe de Deus, no Largo de Roma, aqui em Salvador. Já considerada "venerável" pelo Sr. Joseph Ratzinger (Papa Bento XVI) desde 2009, a freira baiana segue, depois de morta, para ser beatificada, e, talvez, canonizada, para ser a primeira "santa brasileira" (Madre Paulina nasceu na Itália).
A Irmã Dulce fez um belo trabalho com os pobres na área de saúde e assistência social. As "Obras Sociais Irmã Dulce" tomaram vulto. Todos os dias passo em frente à sua sede, onde há um convite de visita ao túmulo do "anjo bom do Brasil", conforme uma das inscrições. Outra diz: "Venerável Dulce".
Imagino que aquela senhora de que me recordo desde os tempos de infância, na década de 80, não gostaria de testemunhar uma coisa dessas. Lembro-me de que ela sofria de algum problema respiratório, e sempre aparecia um tanto arqueada, mas com o olhar sereno. Por cinco décadas, fez o que o Poder Público não se preocupava em fazer: cuidar dos pobres. Ainda hoje são muitos os que procuram socorro nas Obras Sociais que ela deixou.
Todavia, percebo aqui o fenômeno social e religioso da santificação de um indivíduo como antídoto à necessidade de santificação pessoal. Explico: em vez de buscarem a separação do pecado e a promoção do bem, as pessoas preferem se contentar com uma vida comum e relegar ao santo as maiores proezas, como se somente ele pudesse parecer mais com Deus.
Essa é verdade: à semelhança dos heróis cinematográficos, os santos católicos são como paradigmas inalcançáveis, postos como modelo de santidade e operação de milagres para que no coração do povo permaneça a ideia de que ninguém pode ser santo.
Soa para mim altamente artificial o processo de canonização, segundo o qual por meio de um ou mais milagres "comprovados" alguém passa a ser considerado santo. Ora, santos são todos aqueles que um dia foram separados do pecado pelo sangue de Jesus, e que a partir de então ingressaram no processo de santificação sob o poder do Espírito de Deus. Somos santos e nos santificamos a vida toda na Pessoa de Cristo.
Colocar o "santo" no pedestal é perigoso. A proposta do Evangelho vai no sentido diametralmente oposto: "Sede santos, porque eu sou santo" é o que nos diz o SENHOR (I Pe 1.16).
Um comentário:
Muito bem. Li algures "o papa declara santos pessoas que já morreram; Deus declara santos os vivos que ele mesmo justificou."
Postar um comentário