Existem vários caminhos entre o pentecostalismo derivado da Rua Azusa – que exalta demasiadamente o falar em outras línguas – e o pensamento de que os dons carismáticos cessaram. Podemos citar aqui algumas afirmações intermediárias que há por aí:
a) os dons carismáticos não cessaram, mas são raros atualmente;
b) os dons carismáticos não cessaram, mas profecia é pregação, e não uma capacitação sobrenatural para entregar à igreja uma mensagem de edificação, consolação e exortação vinda da parte de Deus;
c) os dons carismáticos não cessaram, mas línguas estranhas não são a única evidência do batismo com o Espírito Santo;
d) os dons carismáticos não cessaram, mas batismo com o Espírito Santo é regeneração, diferente do revestimento de poder, que se evidencia de muitas maneiras, não somente pelas línguas estranhas;
e) os dons carismáticos não cessaram, mas revelações não existem, porque a única revelação é a Palavra de Deus.
Essas são ideias que se encontram no meio caminho entre o cessacionismo e o pentecostalismo que caracteriza o chamado "Movimento Pentecostal". Há certamente outras ideias, e todas elas devem ter seus pontos de intersecção, concordando entre si e contrariando-se mutuamente.
O problema é que no Brasil a Assembleia de Deus, minha denominação, trouxe um pentecostalismo que supervaloriza o falar em línguas, quando, na realidade, a glossolalia desacompanhada de interpretação é o menor de todos os dons (cf. I Co 12 a 14). Afirma-se que não é bem assim, mas a partir do momento em que o batismo com o Espírito Santo é uma experiência indicada a todos, e que o falar noutras línguas é sua evidência indispensável, logo se deduz que as línguas estranhas são um sinal procurado por aqueles que pretendem ser reconhecidos como “batizados no Espírito” - uma categoria com direitos especiais.
"Ora, se eu for batizado e não falar em línguas", pensa o pentecostal assembleiano, "não saberei se fui realmente batizado, e ninguém mais saberá, o que me impedirá, ainda, de alcançar o diaconato e a consagração a pastor". Esse raciocínio criado na seara pentecostal de matriz assembleiana – e de suas congêneres estrangeiras – faz com que a glossolalia seja enaltecida em desfavor de dons mais importantes, superiores, como a profecia e o dom de ensino.
Para não parecer pragmático, e a fim de me lançar ao argumento teológico, afirmo que considero artificial a distinção entre “línguas como sinal do batismo” e “dom de variedade de línguas”. De onde vem isso? Das narrativas de revestimento de poder em At 2, 8, 10 e 19? Ora, não se considera o momento histórico daqueles eventos? Não se entende que ali o Espírito Santo era derramado com línguas estranhas, línguas vernáculas e profecias? Será que apenas o falar em línguas evidencia o ser cheio do Espírito? Será que precisamos dessa evidência? Será que o batismo com o Espírito Santo não consiste justamente em revestimento de poder para evangelizar (Lc 24.49; At 1.5,8), dispensando, assim, quaisquer burocracias denominacionais no sentido de diferenciar “quem é batizado e quem não é”?
Aguardo um movimento pentecostal que repense o Movimento Pentecostal. Um movimento com letra minúscula, significando manifestações teológicas de moderação e reflexão crítica, tendo diante de si as Escrituras e a experiência histórica do Movimento com letra maiúscula.
De fato, é bom lembrar que o Movimento Pentecostal não patenteou o poder de Deus, não detém o monopólio do pentecostalismo. Em matéria de ação sobrenatural e carismática do Espírito Santo, não há como colocar as coisas na régua e no compasso. Quisera eu os irmãos históricos entendessem que, na verdade, o Movimento Pentecostal é muito mais racionalista do que eles imaginam, pois chegou ao ponto de supor que o poder de Deus precisa ser evidenciado de tal e qual maneira. O que é isso, de onde vem e para onde vai o vento?
Essa é minha batalha silenciosa e renhida, além de outras não menos desafiadoras e impopulares. Mas as grandes reformas começam com ideias aparentemente estapafúrdias, que depois se transformam no cotidiano das igrejas.
Mais uma coisa: talvez eu não tenha experimentado o falar em línguas para que refletisse sobre a legitimidade de exigir o fenômeno aos aspirantes a pastor.
*Texto publicado em 18 de maio de 2009 no "site" Ultimato.com.br, no espaço Palavra do leitor.
Um comentário:
Concordo em genero e grau com sua posiçao
Antes EU ACHAVA que para ser batizado no E. Santo tinha que falar em linguas pelo menos uma vez apesar de varios textos de atos 8, atos 10 e atos 19 darem margem para isso , mas hoje tenho minhas duvidas , pois vejo algumas coisas que deixam a desejar nos ditos cheios do Espirito Santo Pentecostais dos quais FAÇO PARTE, valorizamos muitos as manifestaçoes externas como falar em linguas, profetizar ou contar revelaçoes, mas esquecemos O FRUTO Do ESPIRITO (amor, paz dominio proprio etc) que deveria acompanhar quem supostamente foi cheio do espirito, mas o que vemos na maioria dos casos e totalmente contrario, vemos crentes que logo apos as manifestaçoes carismaticas acontecerem na vida dele, se incham, se exaltam, mentem, se orgulham, disputam profecias , disputam coisas superfulas, e desvalorizam ou nao buscam o item principal que e o FRUTO do Espirito.
Estava conversando com um comerciante cristao , e ele estava me informando algumas coisas importantissimas que me levaram a pensar mais um pouco;
No comercio dele os batistoes , os presbiterianos , e outros cristaos nao dao calote via de regra , sao mais educados,sabem se comportar melhor do que os pentecostais que geralmente compram e quando pagam dao o maior trabalho para pagar, os funcionarios pentecostais sao geralmente murmuradores, mal educados, contenciosos, orgulhosos etc
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