Depois de algum tempo, voltamos com a série "Teologia de Panfletos", que não pode manter uma periodicidade mais precisa porque depende dos panfletos "evangélicos" que chegam às minhas mãos. E desta vez nem se trata de um folheto evangélico, mas aparentemente católico. Isso mesmo!
Ontem, ao sair da escola dominical (na Igreja Batista dos Mares, que fomos visitar aqui em Salvador), vimos um panfleto colocado atrás do limpador de para-brisas. Trazia uma imagem que deve ser de santo católico, mas que, por razões de formação religiosa, não consigo discernir. Abaixo do santo, eis a propaganda:
"Santas Missas com a Prece Forte do Exorcismo.
Sexta-feira: 9:00 e 19:30hs
Domingo: 9:00 da manhã
Paróquia das Santas Missões.
[segue o endereço].
Os milagres do Senhor Jesus estão acontecendo na cidade baixa!!!
Você que está sofrendo com doenças, vícios, depressão, dívidas, brigas no lar, não consegue emprego, foi vítima de feitiçaria e sente que algum mal está lhe perturbando; participe das Santas Missas de cura e libertação celebradas pelo Padre (...), o Padre exorcista de Salvador".
[...]
Não sofra mais. Esteja na Paróquia das Santas Missões e o Senhor Jesus mudará a sua vida!!!"
Há uma série de coisas para comentar aqui:
(1) A propaganda parece sair de um panfleto da Igreja Universal do Reino de Deus, da Igreja Internacional da Graça de Deus ou de tantas outras igrejas pseudopentecostais e neopentecostais do nosso país.
(2) As promessas de cura e libertação e de interrupção do sofrimento não observam a soberania divina, transmitindo a suposição de que o homem pode marcar o dia e a hora de Deus operar milagres e transformação de vidas.
(3) Admira-me o fato de se tratar aparentemente de um padre, pois os padres estudam filosofia e teologia, e devem saber que os sofrimentos fazem parte da vida humana, não sendo possível estabelecermos um dia em que todas as aflições cessarão. Onde estava esse suposto padre quando em seu seminário foi estudada a matéria Teodiceia, em que se enfrenta o tema da origem do mal, contrastada com a justiça de Deus?
(4) O "padre exorcista de Salvador" arroga para si um poder especial, como se nele residisse uma unção diferente. Lembro do Mestre Camilo, representante de R.R.Soares em Minas Gerais, que na rádio propalava, ao som de músicas trash, ser ele a maior autoridade em libertação do Brasil (leia neste blog um texto sobre isso, colocando a palavra "bizarro" na ferramenta de busca). Mas todos devem saber que o poder pertence a Deus; que o exorcismo - a prática da expulsão de demônios - não carece de dom espiritual, mas da invocação do Nome do SENHOR Jesus; e que não se deve espiritualizar, muito menos demonizar a causa de todo sofrimento, pois, para surpresa de muita gente, há aflições enviadas por Deus para prova, e há aflições que consistem em consequência do pecado pessoal.
(5) Não sei se esse padre é dissidente da Igreja Católica. Nunca ouvi falar de algo parecido na Igreja Católica. A igreja romana tem imitado algumas coisas do evangelicalismo brasileiro, mas essa propaganda pseudopentecostal é qualquer coisa de inusitado. A Renovação Carismática diz que fala em línguas; padres surgem na TV com sermões bem explicados, parecendo palestrantes motivacionais ou mesmo pregadores evangélicos; músicas evangélicas são cantadas sem cerimônia por padres como Marcelo Rossi e tantos outros; muitas missas são menos solenes, com uma interação maior com o público - mas lá permanecem a adoração a Maria e aos santos; as imagens de escultura; a submissão ao Papa; as penitências; o sacerdócio exclusivo dos líderes ordenados; o batismo infantil; a noção de única igreja cristã; a paridade entre a autoridade escriturística e a autoridade da igreja - com prevalência desta última; o celibato sacerdotal; a infalibilidade papal; os sacramentos que vão além do batismo nas águas e da Ceia do SENHOR; e muito mais.
Não há nenhum problema em os evangélicos serem imitados. É isso mesmo o que queremos. Mas há que se imitar o que é bom. Como disse Paulo, devemos ser seus imitadores, como ele é de Cristo (I Co 11.1). E Cristo jamais prometeu o que não poderia cumprir; jamais colocou a bênção no lugar do Abençoador; jamais fez propaganda de coisas extraordinárias com o objetivo de angariar adeptos.
Pelo contrário: ao sinal de que Seus discípulos acharam muito dura a Sua palavra, Jesus não hesitou em perguntar se eles O queriam deixar, com a maioria dos seguidores o fizera (Jo 6.60-67).
Estamos numa época em que as pessoas estão com pressa, como o cliente na fila do self-service, do fast-food. É a pós-modernidade com sua religião de consumo: tudo é relativizado em nome de uma compra rápida de satisfações materiais, emocionais e espirituais. Essa é a intromissão do mundanismo nas igrejas. É com esse mundanismo que devemos nos preocupar - enquanto alguns se atrapalham com coisas pequenas e sem importância, muitas vezes deixamos de ver como os valores do mundo se intrometem em nossas igrejas. É preciso termos cuidado.
2 comentários:
Shalom!
Uma alegria conhecer seu blog. O Eterno resplandeça o rosto Dele sobre ti e toda a sua família.
Medite no Sl 36.8,9
Nele, Pr Marcello
Visite>> http://davarelohim.blogspot.com/
e veja o texto:
A radiografia de uma sociedade doente
Já ouviu a expressão "o sujo falando mal do mal-lavado"? É o que me veio à mente ao ver essa gente a se imitarem uns aos outros...
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