Os autores de auto-ajuda (evangélica, esotérica, empresarial ou pseudo-psicológica) não patentearam o discurso sobre os sonhos. Discorrer sobre a importância de sonhar não é exclusividade desse pessoal, nem se tornou uma coisa piegas. Sonhar é necessário para que se possa continuar vivo.
Fala-se tanto em sonhos, e de maneira tão errada, que o ato de sonhar ficou banalizado e distorcido. Pregadores evangélicos da linha neopentecostal - hoje imitados por gente pentecostal - têm pregado sobre sonhos como se cada indivíduo tivesse que sonhar com o que eles chamam de "coisas grandes": ascensão ministerial, bens materiais, reconhecimento social.
Em púlpitos antropocêntricos, fala-se comumente de obras portentosas, como pregar em várias nações, ser um pregador de renome, ser "honrado", estar entre os príncipes, "ser cabeça e não cauda", como se o sonho tivesse que ser dirigido a isso. Sonhar passa a ser sinônimo de megalomania, o que naturalmente induz a diversas patologias emocionais dentro das igrejas.
Mas, como eu disse no início, esse pessoal não patenteou os sonhos. Podemos discorrer sobre sonhos de um modo honesto e bíblico. Aliás, sonhar é preciso para que a pessoa continue tendo forças para viver. É uma questão de psicologia mesmo, da própria natureza humana.
Este texto me vem à mente agora porque hoje minha esposa me falava sobre o seu conceito de sonho, que é ir além da realidade. Sim, sonhar com o que já existe não é sonhar. O sonho precisa ir além, alcançar horizontes mais distantes que os nossos próprios olhos tão limitados. Esse é um combustível e tanto!
Ter os pés no chão e a mente no infinito - eis um ponto de equilíbrio para o sonhador. Planejar direitinho, trabalhar com dedicação, e esperar contra a esperança, à moda do apóstolo Paulo...
Quem deu sonhos a José? E no seu caso foram sonhos enquanto dormia, mas sonhos que o motivaram e certamente o ajudaram a vencer os longos anos de prisão no Egito. Imagino que, tendo sido vendido como escravo por seus irmãos e acusado injustamente de assédio sexual, José só manteve sua fé porque Deus já lhe havia falado primeiro. Ele tinha em Quem confiar, e foi esse Deus que lhe concedeu sonhos quando ainda bem jovem. O jovem escravo e prisioneiro tornou-se governador da mais importante nação do mundo, algo que não lhe subiu ao coração, mas que lhe fora, de algum modo, antecipado pelo SENHOR por meio dos sonhos antigos.
Na semana passada, precisamente no dia 28 de agosto, Barack Obama discursou, sendo ele o primeiro negro com chances reais de se tornar presidente dos Estados Unidos. Era o aniversário de 45 anos do memorável discurso I Have a Dream ("Eu Tenho um Sonho"), de Martyn Luther King, o pregador batista que iniciou um grande movimento por direitos civis entre os americanos. Seu sonho está se cumprindo no decurso das décadas, e jamais ele poderia imaginar que 45 anos mais tarde um outro negro falaria sem impedimento algum como presidenciável, num País marcado pelo racismo.
Se José sonhou, se Martyn Luther King sonhou, creio que devo sonhar também. E não digo isso porque eu esteja querendo cultivar um comportamento megalomaníaco - preciso sonhar porque sei que preciso viver.
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