segunda-feira, 12 de maio de 2008

Estudos no Apocalipse - Evangelho, pobreza e sofrimento (2.8-11)

É a vez da Igreja na cidade de Esmirna receber a Carta daquele que é "o primeiro e o último, que esteve morto e tornou a viver". João destaca a Eternidade, Soberania e Obra Salvífica de Jesus. O Eterno morreu e tornou a viver.
Os irmãos de Esmirna recebem consolo no sofrimento. Jesus lhes diz ternamente: "Conheço a tua tribulação, a tua pobreza (mas tu és rico) e a blasfêmia dos que a si mesmos se declaram judeus e não são, sendo, antes, sinagoga de Satanás". Essas palavras são em si mesmas motivo de conforto porque Jesus mostra que conhece, que tem ciência do que está acontecendo com os Seus. Deus não está alheio, absolutamente!
Havia tribulação e pobreza em Esmirna, mas também, para piorar, um grupo de judaizantes queria se impor à igreja. Jesus os chama de "Sinagoga de Satanás", o que é um expressão, para mim, das mais terríveis dentre as registradas na Bíblia.
Fica difícil conciliar esse texto com o evangelho triunfalista da Teologia da Prosperidade e da Confissão Positiva, pois estes movimentos pseudo-cristãos ensinam, em geral, que o crente não pode sofrer, não pode adoecer, tem que ficar rico, tem que sair da pobreza, ter que usar a fé como forma de alcançar milagres e livramentos, e que, se houver problemas financeiros e de saúde, isso é por causa do pecado ou de falta de fé. Ao contrário, Jesus elogia os crentes de Esmirna, pois, mesmo sendo pobres e atribulados materialmente, são ricos sob determinada ótica.
Sim, Jesus não diz em momento nenhum que a pobreza seja uma virtude, nem que teria feito Ele uma "opção pelos pobres", como fez a Igreja Romana. Jesus não está elogiando o fato de ser pobre, mas está dizendo que o importante é um outro tipo de riqueza, a riqueza de ser cristão.
Vale discernir os conceitos de pobreza e miséria. Pobreza é o estado de quem possui parcas condições econômicas, enquanto miséria já é uma situação deplorável, que insulta a dignidade humana.
Dou um exemplo: já entrei em muitas casas pobres, conheço lugares pobres, mas certa vez, a pedido de um irmão em Cristo, fui à casa de um irmão dele, que vivia sozinho havia anos na casa que tinha sido dos pais. O homem estava na casa dos cinqüenta, mas o alcoolismo e o estilo de vida o deixaram com um semblante envelhecido. Eu entrei na casa: não se tratava somente de pobreza, mas de miséria. Era como se o ambiente fosse um retrato físico do que havia naquele coração. Lembro-me da cena até hoje, e o que ficou em minha mente foi a ausência de cor. Falei de Jesus para ele, que, no entanto, logo voltou a seu ritual de embriaguez, e poucos dias depois morreu.
Miséria é, pois, bem diferente de pobreza. Os irmãos de Esmirna eram pobres, sim, e isso em nada desdoura a sua dignidade.
Davi disse num salmo que nunca viu o justo mendigar o pão, nem a sua descendência padecer necessidade, mas não disse que nunca viu um justo pobre.
Agur disse que não quer a pobreza, para não vir a roubar, nem a riqueza, para que não se esqueça de Deus - ele prefere ficar no meio-termo, mas o uso da palavra "pobreza" nesse trecho tem o sentido de não ter nem o básico para sobreviver, o que se aproxima do conceito de miséria (Pv 30.7-9).
Jesus e a maioria dos apóstolos eram pobres. A Igreja começou com gente pobre, e não se diga que através dos séculos a Igreja ficou rica. Instituições eclesiásticas podem ter-se enriquecido, mas os cristãos geralmente são menos abastados.
Nem a pobreza é garantia de humildade nem a riqueza é sinônimo de usura e ambição. Os ricos são tentados à opulência, desperdício e materialismo, mas Jesus pode salvá-los (Lc 18.26,27; Tg 5.1-6; I Tm 6.17-19; ver Lc 18.18-30 e os textos paralelos em Mateus e Marcos sobre o jovem rico que se encontrou com Jesus e preferiu suas riquezas; ver também Lc 19.1-10, quando Zaqueu, rico, encontra Jesus e é salvo).
Além de receberem o conforto de Jesus, quanto à ciência que Ele tem de seu sofrimento, os irmãos de Esmirma ouvem um "não temas". É certo que o diabo lançaria alguns deles na prisão, "para serdes postos à prova", com uma tribulação de 10 dias. Mas aqui vem uma grande promessa: "Sê fiel até à morte, e dar-te-ei a coroa da vida. Quem tem ouvidos, ouça o que o Espírito diz às igrejas: O vencedor de nenhum modo sofrerá dano da segunda morte".
Note-se que Jesus indica a autoria da prisão: o diabo, e não as autoridades romanas, seria o responsável pela perseguição. Ora, se por um lado devemos parar de superestimar o trabalho do diabo, vendo-o onde ele não está, por outro lado precisamos ter discernimento suficiente para compreender que algumas coisas têm a participação dele, sim. Nossa luta é espiritual, acima de tudo.
Aqueles irmãos receberam uma profecia difícil de ouvir: alguns seriam presos, a perseguição seria por dez dias. Mas, de toda maneira, aqui nessa fixação de prazo há também consolo, pois dizem que o pior da tortura é não saber quando vai acabar, não saber se este é o último dia ou não.
Justamente àqueles que estavam sofrendo, com ameaça de morte, Jesus fala de vida, de vitória sobre a morte, de não passar pela segunda morte. É nítido esse contraste: a) Jesus morreu, mas ressuscitou; b) os fiéis até à morte receberão a coroa da vida; c) o vencedor - sobre pobreza, sofrimento, judaizantes, prisões... - não sofrerá o dano da segunda morte.
Esse Evangelho que sabe lidar com pobreza e sofrimento foi o Evangelho que eu recebi quando ainda criança. A mensagem da Cruz nada tem que ver com as superficiais e anti-bíblicas pregações "de vitória" que temos ouvido freqüentemente.
Seria bom atentarmos um pouco mais para a Carta à Igreja de Esmirna.

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