sexta-feira, 9 de maio de 2008

Estudos no Apocalipse - Jesus Cristo glorificado (cap. 1.9-20)

O apóstolo João prossegue na introdução às Cartas endereçadas às sete igrejas da Ásia Menor. Ele introduz as Cartas e o Apocalipse, pois ambos formam um só conjunto literário.
Temos observado que o texto é cristológico e cristocêntrico. Jesus Cristo é apresentado como sendo Deus, a Fiel Testemunha, o Primogênito dos mortos, o Soberano dos reis da terra, o instituidor do sacerdócio real da Igreja, Aquele que virá com as nuvens do céu - o Filho do homem -, o Alfa e o Ômega, aquele que é, que era e que há de vir, o Todo-Poderoso. Jesus é Eterno e Perfeito, formando com o Pai e com o Espírito Santo o Deus Triúno que reina para sempre.
Agora, João continua vendo a Jesus e escrevendo sobre Jesus. Ele diz que é "João, irmão vosso e companheiro na tribulação, no reino e na perseverança, em Jesus..." (v.9). O apóstolo, o antigo pescador, o primoroso escritor, o amigo íntimo de Jesus, o ancião, afirma que é irmão e companheiro daqueles a quem escreve. E não está usando de falsa modéstia, mas verdadeira humildade.
O autor oferece-nos uma tríade: tribulação, reino e perseverança. "Em Jesus", João é nosso companheiro e irmão tanto na tribulação como no reino e na perseverança.
Vamos recordar que, segundo o próprio Jesus, a Vinda do Filho do homem será precedida de uma tribulação. João está dizendo que é nosso irmão e companheiro "na tribulação". Se nós sofremos, João também sofreu. Ele estava escrevendo a igrejas sob constante ameaça de perseguição.
Por outro lado, há o reino. Lembremo-nos de que fomos constituídos por Jesus Cristo reino e sacerdotes para Deus Pai. Embora soframos, pertencemos a um reino espiritual. Nossos valores e princípios não são mais os do mundo, mas os valores e princípios arrolados por Jesus no Sermão do Monte (Mt 5-7). E aguardamos o estabelecimento final do reino de Cristo, de modo transcendente a nossas convicções e comunhão atual.
Entre a tribulação presente e o estabelecimento final do reino de Cristo cabe a nós usarmos de perseverança. O apóstolo Paulo disse que "a tribulação produz perseverança; e a perseverança, experiência; e a experiência, esperança" (Rm 5.3,4). Logo, a tribulação resulta em esperança, e é por isso que nos gloriamos ou devemos nos gloriar nela (Rm 5.3).
Pois bem. Passando por tribulação, vivenciando o reino de Cristo e cultivando a perseverança, João estava agora preso na ilha de Patmos, "por causa da palavra de Deus e do testemunho de Jesus" (v.9). Sua prisão foi motivada pela perseguição. Todos os demais apóstolos já haviam sido martirizados. Restava o velho João, preso numa ilha. Mas João tinha o espírito livre...
João diz que se achou "em espírito, no dia do Senhor", o que significa que ele teve algum arrebatamento de sentidos, num dia de domingo. Note-se que em 1.1 ele se refere a uma revelação de Jesus Cristo, e aqui afirma uma experiência sobrenatural. O relato lembra-me Ezequiel e Daniel, que tinham visões e experiências especiais de revelação divina.
João ouviu, por detrás de si, "grande voz, como de trombeta" (v.10). Aos poucos ele vai descortinando a forma como a revelação lhe foi entregue.
O que dizia essa voz? "O que vês escreve em livro e manda às sete igrejas: Éfeso, Esmirna, Pérgamo, Tiatira, Sardes, Filadélfia e Laodicéia" (v.11). Estas igrejas realmente existiam, não parece que sejam alegóricas. Havia essas cidades e havia igrejas nessas cidades. O Apocalipse teve seu primeiro endereço nessas cidades da Ásia Menor, dirigiu-se primeiro a elas para depois nos alcançar.
Ao ouvir a grande voz, como de trombeta, João se voltou para ver quem falava consigo. O que ele viu? Ele viu "sete candeeiros de ouro, e, no meio dos candeeiros, um semelhante a filho de homem, com vestes talares e cingido, à altura do peito, com uma cinta de ouro" (vv.12,13).
A expressão "filho de homem" aparece em Dn 7.13, como visto em estudo anterior. A descrição de Dn 10.5 é a de "um homem vestido de linho, cujos ombros estavam cingidos de ouro puro de Ufaz" (ouro puríssimo, na Nova Versão Internacional). Há semelhanças entre as descrições de João e Daniel - eles tiveram uma visão de Jesus glorificado.
As vestes talares ou de linho apontam para a solenidade e importância da figura de Jesus. A cinta de ouro sugere majestade. Jesus é Rei e Juiz.
A cabeça e cabelos de Jesus nessa aparição a João "eram brancos como alva lã, como neve" - no contexto do Apocalipse, isso indica pureza, justiça. Seus olhos são "como chama de fogo", sugerindo capacidade de enxergar todas as coisas, Onisciência (ver Dn 7.9 e 10.6 para elementos descritivos do Ancião de dias, que se assemelham à descrição do Filho do homem por João).
Os pés são "como bronze polido, como que refinado numa fornalha". A voz, como de muitas águas (ver Ez 1.24, onde se diz que "o rugido de muitas águas" é como "a voz do Onipotente").
Assim, temos a visão de um Jesus glorificado, Onisciente, Onipotente, Justo e Puro. Não precisamos gastar tempo e esforços discutindo se João está usando metáforas. Parece-me claro que ele descreveu o que viu a partir de coisas de sua própria experiência pessoal. Ninguém explica o sobrenatural a partir do sobrenatural - nossa tendência é procurarmos alguma coisa semelhante aqui da Terra para descrever o inusitado, o espantoso, o glorioso. Por isso, João, Daniel e Ezequiel lançam mão de figuras como pedras e metais preciosos, objetos e outras referências terrenas.
O Filho do homem trazia consigo sete estrelas na mão direita, saindo-lhe da boca uma espada aguda de dois gumes, enquanto o rosto brilhava como o sol na sua força (v. 16). A espada aguda de dois gumes é a Palavra de Deus, pois corta e penetra mais do que qualquer outra espada, a ponto de adentrar à divisão de juntas e medulas, à divisão da alma e do espírito, discernindo pensamentos e intenções do coração (Hb 4.12). O rosto como sol no zênite, ou na sua maior força, é demonstração de glória. Quanto às sete estrelas, trataremos daqui a algumas linhas...
Imaginemos a cena. João está preso na ilha de Patmos. É ele um perseguido ideológico, religioso. Diante de si, aparece Jesus Cristo, com Quem convivera durante cerca de três anos. Ali está Seu amigo, Seu Mestre, Seu Salvador e SENHOR. Antes, era um filho de carpinteiro, encarnado para servir, que Se entregou a tentações e sofrimentos, e depois à Cruz. Fora desprezado, rejeitado, e não tinha aparência nem formosusa, como dissera o profeta em Is 53.3,4. Agora, Jesus estava ali, majestoso, glorioso, cheio de poder.
João não suportou. Ao ter essa visão, caiu aos pés de Jesus "como morto" (v.17). Se antes fora arrebatado "em espírito" (1.10), agora João cai como morto. A sensação foi grande demais - ele viu Jesus glorificado, e por isso caiu ao chão.
A seu turno, Jesus disse: "Não temas; eu sou o primeiro e o último e aquele que vive; estive morto, mas eis que estou vivo pelos séculos dos séculos e tenho as chaves da morte e do inferno" (vv. 17,18). Ao dizer que é o primeiro e o último, Jesus apresentou-Se na mesma condição do Deus que falou a Isaías (44.6; 48.12). Jesus é Deus, não pode haver dúvida quanto a isso.
Jesus ressalta, além de Sua divindade, o fato de ter morrido e ressuscitado, e o poder que assumiu sobre a morte e o inferno. Jesus é o Vencedor, e por causa disso somos hoje, enquanto salvos, "mais que vencedores, por meio daquele que nos amou" (Rm 8.37).
Ainda nessa aparição, Jesus disse ao apóstolo para escrever as coisas que via, "e as que são, e as que hão de acontecer depois destas" (v.19).
O v. 20 é explicativo: Jesus afirma que as sete estrelas em sua mão direita significam "os anjos das igrejas", ao passo que os sete candeeiros de ouro são as sete igrejas.
É às sete igrejas da Ásia Menor que João escreve (1.4). O número sete sugere perfeição. As igrejas não são perfeitas, mas o plano de Deus para a Igreja é perfeito, invencível. Por mais difícil que pareça o cenário, por piores que sejam nossos problemas, a Igreja de Cristo vencerá. Os candeeiros lembram o fato de sermos a luz do mundo (Mt 5.14), que deve brilhar em lugar visível. Os candeeiros são de ouro porque esse metal indica grande importância. A Igreja é importante para Deus.
Quanto aos anjos, não se trata de seres espirituais, pois o termo aqui tem que ver com mensageiro ou representante. O anjo de cada igreja local é seu pastor. Mais uma vez: os sete anjos representados por sete estrelas nada têm a ver com seres angelicais, mas com os pastores de cada comunidade. Jesus iria se dirigir às sete igrejas da Ásia Menor por meio de João, mas falando primeiro aos pastores.
É bom considerarmos que os pastores estão numa posição relevante. Eles representam as igrejas, são seus líderes e servos.
Quando Jesus disse a Pedro que a Igreja seria edificada sobre o Cristo; que as portas do inferno não prevaleceriam contra ela; que Pedro receberia as chaves do reino dos céus; e que tudo o que ele ligasse na terra teria sido ligado no céu, e que tudo o que ele desligasse na terra teria sido desligado no céu (Mt 16.18,19), enfim, quando Jesus disse essas palavras, Ele estava ensinando uma teologia da Igreja, no sentido de que ela é a) fundamentada em Cristo; b) vencedora; c) provida de liderança reconhecida nos céus. Dessa forma, o que a Igreja faz dentro de suas funções típicas é chancelado por Deus, havendo um reconhecimento celestial do que os líderes acordam aqui.
Dito de outro modo, as igrejas não andam à mercê de suas decisões e preferências, porque foi Deus Quem instituiu a Igreja, e não o homem. Precisamos dessa convicção: a Igreja não foi programada por nós - que bom saber disso!
Ao falar com Pedro em Mt 18.19,20, Jesus estava se referindo a todos os pastores. Pedro foi chamado a pastorear os cordeirinhos de Jesus (Jo 21.15-17); e ele mesmo se apresentou como um simples "presbítero" (I Pe 5.1), de modo semelhante ao escritor do Apocalipse (II Jo 1 e III Jo 1).
Recapitulando, temos visto que Jesus Cristo é Deus Onipotente, Onisciente, Eterno, Justo e Puro; que Ele morreu, mas ressuscitou; que Ele Se apresentou em glória e majestade a João; que o apóstolo não suportou contemplar algo tão especial, chegando a cair ao chão como morto; que a Igreja tem uma importância singular no plano de Deus; que os pastores representam as igrejas.
Passaremos, nos próximos estudos, à análise de cada uma das Cartas às sete igrejas.

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