sábado, 31 de maio de 2008

Metáfora à poesia

Chamarão de pranto a poesia:
O choro derramado e forte.
E, quando interrompida se fizer,
Chamá-la-ão soluço, talvez.
Outros quererão ser ela um fado,
Ou, quem sabe, enfermidade.
Eu a chamaria de espirro:
O espirro da tristeza de uma vez.

A terra no coração

A terra no coração é aquela terra
Que um dia existiu na Terra,
Mas que o tempo e o espaço não contém.
A terra no coração é aquela terra
Que só a saudade - ah! saudade - mantém.

A terra no coração é um retrato,
Um pouco tosco, um tanto embaçado,
De um lugar que foi, de um vir-a-ser.
A terra no coração é um relato
Do tempo que o relógio marcou
E de um lugar que viu nascer

O poeta que anda tão distante
Da terra que um dia ele deixou.
Mas, olha só que coisa, olha a desventura!
Se um dia ele voltar, já não se encerra
Além do coração a terra, o chão.

Quem foi chamado e quem se ofereceu

Quem foi chamado não planejou ir.
Quem se ofereceu já estava lá.
Quem foi chamado sonhou sonho diverso.
Quem se ofereceu sonhou o sucesso.
Quem foi chamado escutou uma voz.
Quem se ofereceu fez uns contatos.
Quem foi chamado teve que partir.
Quem se ofereceu partiu sem ter que ir.
Quem foi chamado conhece o que chamou.
Quem se ofereceu está por fora.
Quem foi chamado nem sempre é ouvido.
Quem se ofereceu é oferecido.

sexta-feira, 30 de maio de 2008

Por um deserto

Ando por um deserto muito quente e sem água.
Ando por um deserto efervescente, e deságua
No meu coração a tristeza, que à noite,
Se mostra no frio que dói como açoite.

Ando por um deserto empoeirado e sinistro,
Sequer iludido por miragens quaisquer.
Ando por um deserto contundente, e, aflito,
Grito de dor, sem mirar o prazer.

Ando por um deserto esbranquiçado e ausente
De toda alegria pueril, inocente.
Ando por um deserto que já sei solitário,
Embora repleto de solitários ao lado.

Ando por um deserto que não sabe acabar.
O mapa nas mãos só me enche de trilhas.
Ando, e esse deserto amargura meus passos,
A voz, a pena, a alma, o coração e o traço.

O gnosticismo presente em nossas igrejas!

Estou extremamente preocupado e chateado com o rumo da igreja evangélica brasileira, que se perde em meio a pregações de auto-ajuda, que por sua vez advém de filosofias e religiões orientais, sejam as grandes religiões, como o Hinduísmo e o Budismo, sejam as menores, mas não menos populares, como Seicho-No-Ie, sejam, ainda, as muitas e variadas facetas filosóficas ou religiosas do movimento Nova Era.
Noto, porém, que a base de boa parte de nossos problemas teológicos, pastorais e doutrinários pode consistir na volta, firme e aterradora, do Gnosticismo, agora presente, pouco a pouco, em igrejas históricas, pentecostais históricas e neopentecostais.
Os apóstolos Paulo e João combateram duramente o Gnosticismo, por conta de sua exaltação ao conhecimento oculto, sua negativa da Encarnação de Cristo, de Sua Morte e Ressurreição, seu dualismo entre alma e corpo, espírito e matéria, ignorância e conhecimento, mundo material e currupto versus mundo espiritual e perfeito.
Os gnósticos pregavam que o mal é a ignorância, porque esta afastaria o Homem de conhecer as dádivas colocadas à sua disposição pelas leis metafísicas do Universo. Da mesma forma, Mike Murdock, com sua obra A Lei do Reconhecimento, vem dizer, entre outras heresias, que a ignorância é a causa da pobreza, doença e fracasso. Infelizmente, esse homem, com seu livro repleto de ensinos materialistas e influenciado pela Confissão Positiva, vem sendo considerado "o mais sábio dos Estados Unidos". Devo me sentir, então, um tolo, por achar que o livro dele é ruim, e que não passa de um imitador do Gnosticismo, que usa versículos bíblicos e linguagem evangélica para vender seu produto, seu evangelho da riqueza?
Esse evangelho da saúde e da riqueza, pregado por tantos norte-americanos (Kenneth Hagin, Morris Cerullo, T.L. Osborn, Kenneth Copeland, Frederick Price e muitos outros) é um grave câncer na Igreja, que se alastra por muitas nações. Quem dá testemunho balizado disso é Hank Hannegraaf, em seu excelente livro Cristianismo em Crise (CPAD), em pesquisa séria e sólida. O Movimento da Fé, aqui representado exponencialmente por R.R.Soares e Edir Macedo, mas também por tantos outros líderes de maior ou menor monta, é um perigoso entrave ao assentimento da mensagem da Cruz no coração do pecador.
Estou farto de ouvir pregações vazias, superficiais, materialistas, triunfalistas, de gente que, sabendo ou não da fonte de suas palavras errôneas, contraria totalmente o ensino bíblico, o qual é fundamentado em Cristo, nosso Salvador e Senhor, que veio dar exemplo de virtude, amor, compaixão, ética, e consumar o plano de restauração do Ser Humano à Imago Dei.
Toda essa pregação de "Você vai obter vitória", "Você é um vencedor", "Basta tomar posse da bênção", "Use a palavra para trazer à existência as coisas que não existem", "Use a fé que Deus usou para criar o mundo", toda essa parafernália é oriunda das leis de visualização e reprogramação mental que vêm das filosofias e religiões orientais, carregadas também de aspectos inerentes ao Gnosticismo, heresia grega que exalta o conhecimento para a libertação do Homem, para seu bem-estar físico, emocional, material e social.
A Lei do Reconhecimento, desse tal "sábio" que mencionei, anda no mesmo sentido da lei da atração, ensinada por palestrantes motivacionais, que enchem livros e páginas da Internet com promessas de riqueza, saúde e sucesso, nos mesmos moldes da Teologia da Prosperidade e com os mesmos métodos da Confissão Positiva.
Por e-mail, em contato com o responsável pelo "site" oficial do livro A Lei da Atração, eu soube que essa obra teria sido psicografada por espíritos de 3000 a.C.. No "site", descobri que esses espíritos teriam indicado que o segredo oculto durante séculos e séculos, mas conhecido por pessoas de sucesso ao longo da História, consiste em usar as vibrações do Universo em benefício próprio, pensando ou falando positivamente para trair coisas boas.
Há ainda a noção oriental de que "dinheiro atrai dinheiro", que Mike Murdock usa a seu modo para dizer que contribuição financeira na igreja atrai o favor de Deus - numa interpretação equivocada de II Co 9.6 (semear e colher), Murdock ensina que devemos plantar dinheiro para colher mais dinheiro, como se fosse uma lei de semeadura financeria, que ele chama de "lei da semente".
Ali em II Co 9.1-15, Paulo está andando em sentido oposto ao egoísmo, pois trata de generosidade para com os pobres, ensinando que a doação de ajuda aos necessitados redundará em mais frutos de justiça, boas obras, gratidão e glórias a Deus. Isso nada tem que ver com ambição monetarista nem com investimento financeiro!
Meu Deus, estou cansado. Como não sou pastor, e fico sentado em minha cadeira, tenho que ouvir essas coisas ao púlpito, ou outras semelhantes, que, de uma forma ou de outra, negam o Senhorio de Cristo e a centralidade da Cruz, ante o retorno do Gnosticismo tão combatido pelos santos apóstolos.
Eu só quero pastos verdejantes e águas de refrigério (Sl 23)!

Alguns líderes que não seriam credenciados para a Igreja brasileira atual

Noé não faria o tipo dos pregadores de crescimento de igreja: passou um século pregando e só ganhou sua própria família - pelo menos ninguém pode dizer que ele não ganhou os seus. O fato é que Noé falou durante muito tempo e o povo não deu ouvidos. Certamente ele não era muito lembrado porque pregava exclusivamente a justiça. Se pregasse falsas promessas, atrairia gente à vontade.
Jeremias pregou e ninguém quis ouvir. Seu secretário pensou em largar tudo. O rei mandou queimar seu livro. Jeremias chegou a ser afrontado por um falso profeta, foi preso e deportado para o Egito. Foi acusado de traidor da pátria por que tanto chorou. Certa vez, se atolou na lama, no fundo de um buraco, e um etíope o salvou. Sua pregação era dura demais. Ele mesmo, quando chamado, quis renunciar, dizendo ser criança, e Deus lhe fortaleceu o caráter - mas ele nunca deixou de sofrer. Eis um pregador que poucos gostariam de imitar.
Estevão foi tão sincero que acabou sendo apedrejado em público, por líderes religiosos chamados "Libertos". Ele pregou um sermão repassando a história de Israel, num apanhado até chegar àqueles dias, mas sua eloqüência não lhe serviu de defesa. Por mais claro que fosse seu discurso, e por mais brilhoso que estivesse seu rosto, os maus queriam matá-lo a qualquer custo. Essa não foi uma morte que os triunfalistas esperam para um crente.
Paulo não seria aceito como pastor nem missionário nas igrejas triunfalistas: ele pensava com a cabeça, falava com todas as letras, aprofundava conceitos, debatia sem medo. Seus escritos eram mal interpretados, mas assim mesmo ele escrevia suas Cartas. Passou um bom tempo precisando defender seu apostolado, suas credenciais, e sempre foi alvo de forte oposição. Paulo nunca teve sossego: sentiu fome, apanhou, foi difamado, teve que fugir. A presença era fraca, embora as cartas fossem fortes. Talvez o aceitassem hoje como professor de Escola Dominical, mas com muitas e sérias restrições. Talvez o tolerassem pela erudição, mas sem lhe reservar o púlpito jamais.

O que é Igreja?

Dizemos que vamos à igreja, mas nós somos a igreja.
Igreja não é templo, organização, púlpito, plataforma, nem são os cargos e as paredes.
Igreja não é denominação nem burocracia.
Igreja é organismo.
Igreja é o Corpo de Cristo, o Rebanho do Sumo Pastor, a Lavoura de Deus, o Edifício de Deus, a Família de Deus, a Noiva do Cordeiro, o Povo de propriedade exclusiva de Deus, o Sacerdócio Real, a Nação Santa e a Geração Eleita.
Igreja é instituição divina, fundamentada na Pedra, que é Jesus Cristo.
Igreja é congregação, comunidade, e pode ser local, regional, nacional ou mundial; militante ou triunfante. E pode ser sofredora e perseguida.
Só é igreja quem é salvo. A princípio, convivemos com os nominais, mas eles não são igreja. Os crentes carnais são salvos, mas precisam se livrar de muitas amarras, e são meninos. O joio, por sua vez, está junto com o trigo, igual mas diferente - só os anjos farão a colheita.
Quem se reúne com dois ou três em nome de Jesus não está formando uma igreja? Não está congregando?
Quando os diáconos foram instituídos? Quando houve necessidade.
Quando os presbíteros foram estabelecidos? Quando houve necessidade.
Quem distribui os dons espirituais como quer? O Espírito Santo.
Por que a igreja precisa ardentamente de templos, se cada um dos crentes é templo do Espírito Santo? Por que resumir a igreja às instalações físicas e à burocracia?
Igreja não é lugar de mandos e desmandos. Não é monopólio nem oligopólio. Não é legado de família. Não é curral eleitoral, mas aprisco de ovelhas.
Toda instituição social existe para uma finalidade, que não pode corromper sua essência. Antes de ser instituição social, a Igreja é instituição divina, assim como a família com pai, mãe e filho ou filhos.
A teologia da Igreja está em crise. Não podemos deixar que a Sociologia e as Ciências da Religião nos ensinem o que é Igreja. Se a teologia cristã evangélica não souber responder à pergunta "o que é igreja?", alguém irá responder por nós.
Enquanto isso, muitos crentes ficam sem igreja, tristes, cansados, deprimidos, atabalhoados, amargurados. Às vezes os mais inteligentes e talentosos são os mais pessimistas. Por que será que as pessoas mais risonhas que conheço são as mais idiotas?

quinta-feira, 29 de maio de 2008

As experiências individuais frente ao padrão bíblico

As experiências pessoais do cristão devem ser, todas elas, conferidas com a Bíblia. Ninguém deve, sob pretexto de espiritualidade, erigir a experiência acima da Palavra de Deus.
Alguns crentes empíricos gostam de sustentar seu comportamento anárquico em afirmações do tipo "Deus opera como quer", "ninguém pode explicar o agir de Deus", ou, ainda, "Deus opera fora da lógica humana".
Essas frases, embora corretas a princípio, são mal-utilizadas por pessoas sensacionalistas, que enaltecem a emoção ou o subjetivismo como critério do ser espiritual, deixando de lado a razão e o conhecimento das Escrituras.
Jesus disse que o erro dos fariseus era não conhecer as Escrituras nem o poder de Deus (Mt 22.29; Mc 12.14). Enquanto os racionalistas apelam para a importância de enxergar as Escrituras somente, os "emocionalistas" enfatizam o que chamam de "poder de Deus", esquecendo-se do estudo da Escritura: ambas as correntes estão erradas, uma vez que tanto a Escritura quanto o poder são extremamente necessários, ao passo que o poder de Deus decorre da Escritura e vem registrado na mesma Escritura, que contém a causa, a forma e a oportunidade dessa operação sobrenatural do SENHOR entre os homens, por meio dos sinais e dons espirituais neotestamentários (At 2.1-13; 8.14-14; 10.44-46; Rm 12.3-8; I Co 12.1-7; Ef 4.7-13).
Considero, pois, que algumas balizas precisam ser observadas quanto a esse tema:
Em primeiro lugar, a Bíblia é nossa regra infalível de fé e conduta, atuando normativamente na vida cristã. Foi assim que o apóstolo Paulo disse que toda a Escritura é inspirada e útil para o ensino, repreensão, correção e educação na justiça, a fim de que o homem seja perfeito (maduro) e perfeitamente habilitado para toda boa obra (II Tm 3.15,16); e que não devemos ultrapassar o que está escrito (I Co 4.6).
Em segundo lugar, precisamos ter bom senso, pois até mesmo aquilo que se apresenta como profecia e manifestação do Espírito deve ser julgado, retendo-se o que é bom (I Co 14.29; I Ts 5.21). Ao menino cai bem a ingenuidade, mas ao homem maduro, o entendimento fica melhor (I Co 13.11).
Em terceiro lugar, nada pode alterar aquilo que vem contido na mensagem evangélica. Com um sentido de urgência, Paulo exortou a que não aceitássemos outro evangelho, nem que ele ou um anjo do céu aparecesse com palavras diferentes, pois quem vai além do Evangelho de Cristo é anátema, que quer dizer "maldito" (Gl 1.6-9).
Em quarto lugar, há a imperiosa necessidade de atentarmos para as tradições apostólicas (At 2.42) que recebemos (I Co 15.1-3), as quais são cristocêntricas, e não antropocêntricas. Dito de outro modo, nossa confissão é centrada na Cruz de Cristo, em Sua Encarnação, Morte, Ressurreição, Ascensão e promessa de glorificação em Sua Vinda (Rm 10.9,10; I Co 15), sendo Ele, exatamente por isso, o Verbo, o parâmetro de todas as coisas, no Qual tudo deve ser medido. Qualquer experiência que fuja às prescrições da Palavra de Deus escapa, na verdade, a Cristo, pois Jesus Cristo é a Palavra de Deus personificada, Aquele que cumpriu cabalmente os desígnios divinos, e que pratica todo o bem pretendido por Deus Pai.
Em quinto lugar, as experiências do Antigo Testamento não podem ser tomadas como esteio para a Igreja de Cristo, seja porque a lei consistiu em "sombra das coisas que haviam de vir" (Cl 2.16,17), "sombra dos bens vindouros (Hb 10.1), seja porque as passagens exclusivas a Israel foram escritas "para exemplo e advertência nossa" (I Co 10.11).
Em sexto lugar, Paulo escreveu: "Se alguém se considera profeta ou espiritual, reconheça ser mandamento do Senhor o que vos escrevo. E se alguém o ignorar, será ignorado" (I Co 14.37,38).
Portanto, com muito amor e cuidado, gostaria de convidar o leitor a refletir sobre este importante assunto, para que não venhamos a contribuir para o triste avanço do individualismo e do relativismo que hoje buscam se infiltrar nos arraiais evangélicos, com algum sucesso.

terça-feira, 20 de maio de 2008

Elementos de um currículo para ser importante no Brasil de hoje

Ontem guerrilheiro no Araguaia, hoje ministro durão.
Ontem preso político, hoje político preso.
Ontem torturado, hoje manipulador de mentes.
Ontem democrático, hoje arrogante.
Ontem comunista, hoje amigo dos bancos.
Ontem trabalhista, hoje parte da elite.
Ontem cheio de ideais, hoje buscando reais.
Ontem defensor de minorias, hoje criador de maiorias.
Ontem opositor virulento, hoje governista melindrado.
Ontem atirador de pedras, hoje telhado estilhaçado.
Ontem gritava com fervor, hoje escolhe as palavras.
Ontem queria investigações, hoje pede cautela.
Ontem era intransigente, hoje, um negociador.

segunda-feira, 19 de maio de 2008

PARA NÃO FICAR SÓ EM MINHAS PALAVRAS...:

A centralidade da Morte e Ressurreição de Cristo:
"Irmãos, venho lembrar-vos o evangelho que vos anunciei, o qual recebestes e no qual ainda perseverais; por ele também sois salvos, se retiverdes a palavra tal como vo-la preguei, a menos que tenhais crido em vão. Antes de tudo, vos entreguei o que também recebi: que Cristo morreu pelos nossos pecados, segundo as Escrituras, e que foi sepultado e ressuscitou ao terceiro dia, segundo as Escrituras. E apareceu a Cefas e, depois, aos doze. Depois, foi visto por mais de quinhentos irmãos de uma só vez, dos quais a maioria sobrevive até agora; porém alguns já dormem. Depois, foi visto por Tiago, mais tarde, por todos os apóstolos e, afinal, depois de todos, foi visto também por mim, como por um nascido fora de tempo" (I Co 15.1-8).
A importância de manter o Evangelho genuíno.
"Admira-me que estejais passando tão depressa daquele que vos chamou na graça de Cristo para outro evangelho, o qual não é outro, senão que há alguns que vos perturbam e querem perverter o evangelho de Cristo. Mas, ainda que nós ou mesmo um anjo vindo do céu vos pregue evangelho que vá além do que vos temos pregado, seja anátema. Assim, como já dissemos, e agora repito, se alguém vos prega evangelho que vá além daquele que recebestes, seja anátema" (Gl 1.6-9).
A justificação exclusivamente pela fé em Cristo.
"Sabendo, contudo, que o homem não é justificado por obras da lei, e sim mediante a fé em Cristo Jesus, também temos crido em Cristo Jesus, para que fôssemos justificados pela fé me Cristo e não por obras da lei, pois, por obras da lei, ninguém será justificado" (Gl 2.16).
O valor do ensino apostólico.
"Assim, pois, irmãos, permanecei firmes e guardai as tradições que vos foram ensinadas, seja por palavra, seja por epístola nossa" (II Ts 2.15).
O erro de voltar a elementos do Judaísmo.
"Outrora, porém, não conhecendo a Deus, servíeis a deuses que, por natureza, não o são; mas agora que conheceis a Deus ou, antes, sendo conhecidos por Deus, como estais voltando, outra vez, aos rudimentos fracos e pobres, aos quais, de novo, quereis ainda escravizar-vos? Guardais dias, e meses, e tempos, e anos. Receio de vós tenha eu trabalhado em vão para convosco" (Gl 4.8-11).
Avareza e ganância promovendo heresias.
"Se alguém ensina outra doutrina e não concorda com as sãs palavras de nosso Senhor Jesus Cristo e com o ensino segundo a piedade, é enfatuado, nada entende, mas tem mania por questões e contendas de palavras, de que nascem inveja, provocação, difamações, suspeitas malignas, altercações sem fim, por homens cuja mente é pervertida e privados da verdade, supondo que a piedade é fonte de lucro. De fato, grande fonte de lucro é a piedade com o contentamento. Porque nada temos trazido para o mundo, nem coisa alguma podemos levar dele. Tendo sustento e com que nos vestir, estejamos contentes. Ora, os que querem ficar ricos caem em tentação, e cilada, e em muitas concupiscências insensatas e perniciosas, as quais afogam os homens na ruína e perdição. Porque o amor do dinheiro é raiz de todos os males; e alguns, nessa cobiça, se desviaram da fé, e a si mesmos se atormentaram com muitas dores (...) Exorta aos ricos do presente século que não sejam orgulhosos, nem depositem a sua esperança na instabilidade da riqueza, mas em Deus, que tudo nos proporciona ricamente para nosso aprazimento; que pratiquem o bem, sejam ricos de boas obras, generosos em dar e prontos a repartir; que acumulem para si mesmos tesouros, sólido fundamento para o futuro, a fim de se apoderarem da verdadeira vida. E tu, ó Timóteo, guarda o que te foi confiado, evitando os falatórios inúteis e profanos e as contradições do saber, como falsamente lhe chamam" (II Tm 6.3-10, 17-20).
"Assim como, no meio do povo, surgiram falsos profetas, assim também haverá entre vós falsos mestres, os quais introduzirão, dissimuladamente, heresias destruidoras, até ao ponto de renegarem o Soberano Senhor que os resgatou, trazendo sobre si mesmos repentina destruição. E muitos seguirão as suas práticas libertinas, e, por causa deles, será infamado o caminho da verdade; também, movidos por avareza, farão comércio de vós, com palavras fictícias; para eles o juízo lavrado há longo tempo não tarda, e a sua destruição não dorme" (II Pe 2.1-3).
"Ai deles! Porque prosseguiram pelo caminho de Caim, e, movidos de ganância, se precipitaram no erro de Balaão, e pereceram na revolta de Corá (Jd 11).
O erro dos que se promovem a apóstolos:
"Conheço as tuas obras, tanto o teu labor como a tua perseverança, e que não podes suportar homens maus, e que puseste à prova os que a si mesmos se declaram apóstolos e não são, e os achaste mentirosos" (Ap 2.2).

QUEM SE PREOCUPA COM A ORTODOXIA?

Debato-me contra heresias que insistem em se infiltrar na Igreja brasileira. Já escrevi, pensei e ensinei sobre os vícios da Confissão Positiva, da Teologia da Prosperidade, do Triunfalismo; sobre os exageros do pentecostalismo histórico e os abusos do pentecostalismo pós-moderno; sobre as distorções hermenêuticas por falta de boa gramática ou por má-fé. Tenho sofrido com o subjetivismo, o pluralismo, o relativismo, o secularismo, o hedonismo, o individualismo de nosso tempo, nas igrejas. Estou chateado com tudo isso.
Antes, porém, acreditava que o exame honesto da Escritura faria com que as pessoas se deixassem persuadir pela Verdade. Cria que faltava exposição organizada e freqüente da Bíblia para que as pessoas, enfim, compreendessem o que dizem os textos, e que assim viessem a entender que muito do que se diz em púlpitos afasta a centralidade da Cruz. Agora, continuo com a certeza de que faltam bons expositores da Bíblia, mas não considero que sua presença abundante mudaria muito.
Gostaria de não me inclinar a esse pensamento pessimista, pois cultivo o sonho de, um dia feliz, ter à minha disposição um lugar em que eu possa pregar e ensinar a Bíblia versículo por versículo, com critérios sadios de interpretação, a um público sedento. Será que terei essa oportunidade ainda?
Tenho a impressão de que o argumento "está escrito", outrora forte, padece diante de "palavras fictícias" com as quais se faz comércio de mentes incautas (II Pe 2.3). Parece-me que, se para mim é suficiente o cânon bíblico, para outros vale mais a emoção, o resultado, a experiência, o sonho realizado, o "crescimento" da igreja.
Vou completar 31 anos de idade no dia 23 de maio. Estou relativamente novo, mas não sou menino, e já me sinto cansado. É um cansaço emocional, de quem não acha pasto verdejante nem água de refrigério (Sl 23) por esses apriscos que tenho conhecido.
Eu só queria poder compartilhar a Verdade, mas percebo que a mentira voa a jato.

sexta-feira, 16 de maio de 2008

Estudos no Apocalipse - A visão do trono de Deus (4.1-11)

Deixamos a seção das Cartas às sete igrejas (capítulos 2 e 3) e nos dirigimos agora à seção dos capítulos 4 e 5, destinados à visão do trono de Deus e do Livro selado com sete selos. Começamos a enfrentar textos que demandam cada vez mais atenção, dada a natureza metafórica da linguagem, que não dispensa um estudo do significado histórico de figuras empregadas pelo apóstolo.
"Depois destas coisas", quer dizer, depois de ter contemplado a visão de Jesus glorificado, João olha uma porta aberta no céu, e ouve a primeira voz que ouvira antes, "como de trombeta" (1.10). Registre-se que o "depois destas coisas" não se segue à escrita das Cartas, porque estas certamente foram redigidas depois das visões, como introdução ao Livro de Apocalipse. O "depois" refere-se à visão de Jesus glorificado, como descrito em 1.12-16, e ao que Jesus lhe disse em 1.11,17-20.
No mesmo sentido do que dissera em 1.1,19, João diz que Jesus lhe mostrou "o que deve acontecer depois destas coisas" (v.1). Então, ocorreu assim: primeiro Jesus disse: "Escreve, pois, as coisas que viste, e as que são, e as que hão de acontecer depois destas" (1.19). Logo em seguida, tendo explicado o mistério das sete estrelas e sete igrejas (1.20), Jesus disse: "Sobe para aqui, e te mostrarei o que deve acontecer depois destas coisas" (4.1).
"Imediatamente", João achou-se "em espírito". Ele teve um arrebatamento de sentidos, uma experiência espiritual, conforme já relatara antes (1.10). A visão lhe foi dada enquanto estava em espírito, mas a inspiração para escrever o Livro é outra coisa: ao escrever inspirado pelo Espírito Santo, João registrou a visão a partir de coisas familiares, que pudessem comunicar o que vira, como as pedras preciosas e o mar de vidro.
Note-se o uso das expressões "semelhante, no aspecto" (vv. 3,4); "um como que mar de vidro, semelhante ao cristal" (v.6). Essas foram maneiras que o apóstolo João usou para descrever o que viu, pois se tratava de algo incomum, celestial, glorioso.
Nosso cérebro trabalha com associações. Quando vemos alguma coisa diferente, jamais vista, logo procuramos um jeito de associar aquilo a um referencial conhecido. Assim também ocorreu com João. Aliás, o sobrenatural na Bíblia sempre é descrito a partir do natural - fogo para o Espírito Santo (v.g., línguas repartidas "como de fogo" em At 2.3).
Há, porém, que se fazer uma distinção: uma coisa é a associação que João faz em termos de aspecto do que viu; outra coisa é a visão realmente parecer com isto ou aquilo. Embora sutil, a distinção é importante.
Vejamos: para descrever o Ser que se achava sentado no trono, João apelou para as pedras de jaspe e sardônio, e, quanto ao arco-íris em volta do trono, disse que se assemelha a esmeralda. Ele disse literalmente que o "que se acha assentado no trono é semelhante, no aspecto, a pedra de jaspe e sardônio, e, ao redor do trono, há um arco-íris semelhante, no aspecto, a esmeralda" (v.3); também disse que "há diante do trono um como que mar de vidro, semelhante ao cristal" (v.6). Essas comparações partem do apóstolo por associação, pois ele mesmo usa expressões que denotam isso.
Quanto a outros elementos da visão, o texto dá a entender que foram descritos por João na exata medida em que foram vistos.
O próprio arco-íris ao redor do trono (v.3); os 24 anciãos sentados em volta do trono e com coroas de ouro (v.4); os relâmpagos, vozes e trovões diante do trono (v.5); as sete tochas de fogo, "que são os sete Espíritos de Deus" (v.5; cf. 1.4; 3.1); os "quatro seres viventes" no meio do trono e ao redor do trono, "cheios de olhos por diante e por detrás" (v. 6).
Conquanto saibamos que esta é uma visão do trono de Deus e que no seu entorno não existem animais, homens de idade coroados nem fenômenos da natureza, admitimos aqui que se trata de elementos próprios da visão, e não da associação feita pelo apóstolo. Isso se coaduna com o método de só ver no texto o que ele diz, sem alegorias nem injunções pessoais.
O que nos interessa é achar caminhos para compreender o que tudo isso disse a João e a seus contemporâneos. Num segundo plano, o que tudo isso diz a nós hoje.
Aquele que está assentado no trono é Deus Pai. O arco-íris, os relâmpagos, trovões e vozes dão a idéia de Seu poder e glória, assim como o trono indica a Sua majestade. Lembremos que, ao presenciar os trovões, relâmpagos e o clangor da trombeta quando Yahwéh falava como Moisés no monte Sinai, que fumegava, o povo ficou de longe, com medo (Ex 20.18-21; Dt 5.22,23). Enquanto Moisés, na condição de mediador, falava com Yahwéh "à nuvem escura", o povo estremecia de pavor, dizendo "não fale Deus conosco, para que não morramos".
Eu destaquei a expressão "Deus conosco" porque é o mesmo que Emanuel (hebraico). Não por acaso, Jesus Cristo recebeu o nome de Emanuel (Mt 1.23). Enquanto Moisés era simplesmente um mediador, Jesus Cristo é Mediador (I Tm 2.5), mas é igualmente Deus entre nós.
O aspecto de Deus Pai é maravilhoso, indescritível com palavras humanas. A visão foi explicada pelo auxílio de pedras como sardônio e jaspe.
Além do mais, não se trata de João ter visto a Deus pessoalmente, mas de um vislumbre de Seu poder, glória e majestade. Ninguém pode ver a Deus face a face. "Ninguém jamais viu a Deus", escreveu o próprio João (I Jo 4.12). Séculos antes disso, Jacó disse ter visto a Deus "face a face" (Gn 32.30), mas o que ocorreu ali foi a luta com um anjo, depois do vau de Jaboque.
Quanto a Moisés, é certo que ele mantinha intimidade com Yahwéh, a ponto de conversar com Ele "cara a cara", mas isso também não nos autoriza a dizer que ele viu de fato a Deus, pois João diz categoricamente que ninguém jamais O viu. Precisamos entender o sentido das expressões. No caso de Moisés, e de alguns mais de seus contemporâneos, o que houve foram teofanias. No entanto, precisamos explicar isso.
Primeiro, sabemos que Moisés falava ao SENHOR "face a face, como qualquer fala a seu amigo" (Ex 33.11; cf. Ex 3.2-6; Dt 34.10).
Em Ex 24.1-11, temos o relato de quando Moisés, Arão, Nadabe, Abiú e 70 anciãos de Israel sobem o monte Sinai para a Aliança com Yahwéh. Somente Moisés poderia chegar ao SENHOR, os demais ficariam adorando de longe. De madrugada, Moisés se levantou, ergueu um altar ao pé do monte com 12 colunas, "segundo as doze tribos de Israel" (v.4), e enviou uns jovens para oferecerem holocaustos e sacrifícios pacíficos de novilhos.
Mais à frente, diz um trecho: "E viram o Deus de Israel, sob cujos pés havia uma como pavimentação de pedra de safira, que se parecia com o céu na sua claridade. Ele não estendeu a mão sobre os escolhidos dos filhos de Israel; porém eles viram a Deus, e comeram, e beberam" (vv.10,11). Enquanto João empregou sardônio, jaspe e esmeralda, Moisés escreve acerca de "uma como pavimentação de pedra de safira" que estaria sob os pés de Deus, e que se parecia com o céu na sua claridade.
Não consigo deixar de perceber uma semelhança entre as visões do grupo de Moisés e a de João. Mas temos ainda Ezequiel.
Ora, em Ez 1.26-28, lemos que o profeta viu "algo semelhante a um trono, como uma safira". Sobre "esta espécie de trono" estava sentada "uma figura semelhante a um homem" (v.26). O que mais o profeta viu? "Vi-a como metal brilhante, como fogo ao redor dela, desde os seus lombos e daí para cima; e desde os seus lombos e daí para baixo, vi-a como fogo e um resplendor ao redor dela" (v.27).
Há mais: "Como o aspecto do arco que aparece na nuvem em dia de chuva, assim era o resplendor em redor. Esta era a aparência da glória do SENHOR; vendo isto, caí com o rosto em terra e ouvi a voz de quem falava" (v.28).
O mesmo arco-íris visto por João fora contemplado séculos antes por Ezequiel. Se João descreveu a glória divina com sardônio e jaspe, Ezequiel a descreveu genericamente como "metal brilhante". Ambos viram fogo: João viu sete tochas de fogo; Ezequiel viu fogo ao redor do trono, e na própria figura nele assentada.
Os quatro seres viventes ao redor do trono e no meio dele fazem recordar Ez 1.4-25...
João viu quatro seres cheios de olhos, no meio do trono e ao redor dele: o primeiro semelhante a leão; o segundo, a novilho; o terceiro tinha o rosto de homem; e o quarto parecia uma águia voando. Esses seres tinham seis asas cada um, e não cessavam de dizer, dia e noite: "Santo, Santo, Santo é o Senhor Deus, o Todo-Poderoso, aquele que era, que é e que há de vir" (v.8). Estamos diante de um culto no Céu.
Agora vem um momento especial, porque João se refere a algo que irá acontecer. Vejamos: "Quando esses seres viventes derem glória, honra e ações de graças ao que se encontra sentado no trono, ao que vive pelos séculos dos séculos, os vinte e quatro anciãos prostrar-se-ão diante daquele que se encontra sentado no trono, adorarão o que vive pelos séculos dos séculos e depositarão as suas coroas diante do trono, proclamando: Tu és digno, Senhor e Deus nosso, de receber a glória, a honra e o poder, porque todas as coisas tu criaste, sim, por causa da tua vontade vieram a existir e foram criadas" (vv. 9-11).
Os quatro seres viventes e os 24 anciãos estão cultuando a Deus Pai. Os números 4 e 24 podem nos dizer alguma coisa dentro da numerologia judaica. Mas, antes disso, vejamos Ez 1.4-25.
Em suas "visões de Deus", tendo diante de si os céus abertos (Ez 1.1), Ezequiel viu um vento tempestuoso, uma grande nuvem, "com fogo a revolver-se, e resplendor ao redor dela", e viu no meio disso "uma coisa como metal brilhante, que saía do meio do fogo" (v. 4).
O profeta viu ainda que do meio dessa nuvem saía:
"(...) a semelhança de quatro seres viventes, cuja aparência era esta: tinham a semelhança de homem. Cada um tinha quatro rostos, como também quatro asas. As suas pernas eram direitas, a planta de cujos pés era como a de um bezerro e luzia como o brilho de um bronze polido. Debaixo das asas tinham mãos de homem, aos quatro lados; assim todos os quatro tinham rostos e asas. Estas se uniam uma à outra; não se viravam quando iam; cada qual andava para a sua frente. A forma de seus rostos era como o de homem; à direita, os quatro tinham rosto de leão; à esquerda, rosto de boi; e também rosto de águia, todos os quatro. Assim eram os seus rostos. Suas asas se abriam em cima; cada ser tinha duas asas, unidas cada uma à do outro; outras duas cobriam o corpo delas. Cada qual andava para a sua frente; para onde o espírito havia de ir, iam; não se viravam quando iam. O aspecto dos seres viventes era como carvão em brasa, à semelhança de tochas; o fogo corria resplandecente por entre os seres, e dele saíam relâmpagos, os seres viventes ziquezagueavam à semelhança de relâmpagos" (5-14; grifei).
O profeta ainda descreve, de modo difícil de entender, o aspecto de quatro rodas brilhantes, uma dentro da outra, que se movimentavam em quatro direções, conforme o espírito dos quatro seres, que nelas estava (Ez 1.15-25). Certamente nem Ezequiel compreendeu isso. Limitou-se a descrever.
"Sobre a cabeça dos seres viventes havia algo semelhante ao firmamento, como cristal brilhante que metia medo, estendido por sobre a sua cabeça" (Ez 1.22). João, por sua vez, disse que viu um como que mar de vidro, semelhante a cristal (Ap 4.6).
O importante aqui é que o relato de João é muito parecido com o de Ezequiel: quatro seres alados com rostos de leão, boi ou novilho, homem e águia; alusões a fogo, resplendor, brilho, cristal, arco-íris, trono com alguém sentado.
Em suma: eles viram a glória de Deus.
Prosseguiremos depois.

quarta-feira, 14 de maio de 2008

Estudos no Apocalipse - A igreja morna (3.14-22)

Chegamos à derradeira Carta dentre as enviadas às sete igrejas da Ásia pelas mãos de João. Não se trata de cartas endereçadas a cada uma delas e depois compiladas no Livro de Apocalipse, mas de cartas previamente agrupadas no Livro, como que numa introduçao à Revelação Escatológica, somada a advertências particulares.
Estamos agora diante da igreja em Laodicéia, citada por Paulo em Cl 4.15,16, quando pede que a Carta aos Colossenses seja lida entre os de Laodicéia, e que a Carta aos de Laodicéia seja lida em Colossos.
De todas as situações descritas nas Cartas, a de Laodicéia é, de longe, a pior.
Primeiro, Jesus Se apresenta como "o Amém, a testemunha fiel e verdadeira, o princípio da criação de Deus" (v. 3.14). É certo que Jesus Cristo não foi criado, pois Ele é Eterno, algo já estudado em torno de textos anteriores. Jesus é o mais importante. O princípio da criação de Deus não se refere a precedência, mas preeminência, prioridade. Jesus é o primeiro em importância, acima de toda a Criação. É isso.
De início, à fórmula "Conheço as tuas obras" ajunta-se a frase: "...que nem és frio nem quente. Quem dera fosses frio ou quente!" (v.15).
O texto prossegue veemente: "Assim, porque és morno e nem és quente nem frio, estou a ponto de vomitar-te da minha boca; pois dizes: Estou rico e abastado e não preciso de coisa alguma, e nem sabes que tu és infeliz, sim, miserável, pobre, cego e nu" (16,17).
Ser vomitado da boca de Deus é muito sério. A frase é tão terrível quanto se propõe, e a causa disso é a mornidão espiritual. Ser quente ou frio é melhor do que ser indiferente, apático.
Ninguém gosta de ser chamado de "frio". Nós pentecostais temos o péssimo hábito de denominar de "frios" aqueles que não adotam nossa doutrina do batismo com o Espírito Santo evidenciado por línguas, ou que adoram a Deus sem barulho. Mas a frieza e o fervor referidos aqui são postos como melhores que a indiferença. Deus aborrece os indiferentes.
Qual o problema específico dos crentes em Laodicéia? Parece que eram materialistas. Sim, achando-se ricos, eram de fato pobres, ao contrário dos de Esmirna, que, pobres materialmente, eram ricos no caráter.
Jesus, porém, oferece esperança: aconselha que d'Ele comprem "ouro refinado pelo fogo" para que fiquem ricos, e vestes brancas para se vestirem, para evitar que vejam a vergonha de sua nudez, além de colírio para que possam enxergar.
Então, os irmãos em Laodicéia tinham um caráter mau, impureza (moral) e cegueira espiritual, mas Jesus diz que disciplina e corrige a todos quantos ama (v.19). Por isso, há chance de arrependimento (idem).
O convite para a ceia no v. 20 às vezes é interpretado como um convite ao pecador, mas é dirigido à igreja, aos crentes. Jesus está à porta e bate para que o cristão indiferente lhe abra a porta e participe de um banquete.
E, assim como Jesus Se sentou com o Pai no trono deste, o vencedor sentar-se-á com Jesus no Seu trono (v. 21). Essa é a promessa para os vitoriosos.
A frase recorrente "Quem tem ouvidos, ouça o que o Espírito diz às igrejas" (v. 22) fecha o ciclo das Cartas às sete igrejas. Nós que temos ouvidos precisamos ouvir essas advertências, pois somos membros da Igreja de Cristo. Em vez de encarar as sete igrejas como alegorias para estágios diferentes da História Eclesiástica, vejamos essas igrejas como comunidades locais do primeiro Século, as quais partilhavam de problemas e virtudes de nossas comunidades hoje, no Séc. XXI.
O conjunto de promessas ao vencedor destina-se a todos os que vencerem, não podendo ser compreendidas como dirigidas a cada uma daquelas igrejas, mas a todas as igrejas de Cristo, a todos os cristãos. As sete Cartas foram escritas dentro do contexto do Livro de Apocalipse, e nesse sentido devem ser lidas como parte do todo. Militam em favor disso as frases de introdução "Ao anjo da igreja que está em tal lugar"; a memória de atributos de Jesus, na maioria referindo-se à visão de Jesus glorificado (1.9-20); a fórmula "conheço as tuas obras..." ou similares; a promessa ao vencedor; e finalmente a antecipação de figuras que aparecem depois, como a Cidade Santa, por exemplo.
Não penso que Laodicéia seja o símbolo da apostasia final, assim como não vejo Filadélfia como alegoria da igreja do tempo que precede a Volta de Cristo. Até mesmo para os crentes de Laodicéia há promessas maravilhosas em caso de arrependimento, não obstante o "estou a ponto de vomitar-te da minha boca".
Só mais uma consideração: quem defende que o cristão não pode perder a salvação em nenhuma hipótese deveria estremecer diante do fato de que a uma igreja Jesus disse que estava a ponto de vomitá-la. Afinal, se aquela não fosse originalmente uma igreja, por que motivo Jesus a trataria como igreja, a quem ama, disciplina e corrige?

terça-feira, 13 de maio de 2008

Estudos no Apocalipse - A igreja que Jesus amou (3.7-13)

Deixemos que PIERRE PRIGENT (2002: 79) nos dê uma apresentação da cidade asiática de Filadélfia:
"Filadélfia era uma pequena cidade de existência relativamente recente (segunda metade do século II a.C.). Ela é assim denominada em memória do seu fundador, Atalo II Filadelfo. É picante (sic) constatar que depois do favor imperial manifestado primeiro por Tibério (no ano 17 o imperador ajuda na construção da cidade gravemente atingida pelo tremor de terra) e depois por Calígula, a cidade levou por um momento o nome de Nova Cesaréia. Alguns anos depois, recebeu por um tempo o nome de Flávia em honra de Vespasiano. Só a sua importância relativa explica que uma cidade tão preocupada em venerar os imperadores tenha tido de esperar o século III para receber a dignidade do neocorato.
Localizada em plena região vulcânica, Filadélfia era justamente reputada tanto pela freqüência dos seus perigosos terremotos como pela fertilidade dos campos ao seu redor".
Ainda de acordo com PRIGENT (idem), Eusébio informou que uma das profetisas montanistas, Âmia, era originária de Filadélfia.
Filadélfia é para os cristãos um nome emblemático. Existem igrejas e organizações para-eclesiásticas que adotam em sua denominação o termo "filadélfia". A Capital do Estado americano da Pensilvância - Philadelphia - não tem esse nome por acaso. Trata-se de um fruto dos colonizadores protestantes ingleses no Séc. XVII.
Ao lado da igreja em Esmirna, está a igreja em Filadélfia recebendo só elogios de Jesus Cristo. Assim como Esmirna deveria ser fiel até à morte para receber a coroa da vida (2.10), Filadélfia deve conservar o que tem, para que ninguém tome a sua coroa (3.11).
Comparando Filadélfia e Esmirna, fico pensando por que motivo não há uma cidade americana chamada "Esmirna" (se há nunca ouvi falar); e por que movito não há igrejas - pelo menos brasileiras - que em sua denominação adotaram o vocábulo "Esmirna". Deve haver uma explicação, pois aquela igreja também só recebeu elogios.
Conversando com a minha esposa, ela sugeriu uma hipótese que considero razoável - a igreja em Esmirna sofreu muito e era pobre. Parece que as pessoas não querem passar por isso, como se as igrejas-modelo não sofressem. Aliás, ninguém olha para as igrejas pobres do mundo como igrejas-modelo. As igrejas tomadas como exemplo geralmente têm dinheiro e relações políticas.
Mas, voltando ao caso de Filadélfia, Jesus apresenta-Se a ela como "o santo, o verdadeiro, aquele que tem a chave de Davi, que abre, e ninguém fechará, e que fecha, e ninguém abrirá" (v.7).
A referência a Davi é um dos exemplos do caráter judaico de muitas metáforas apocalípticas, unindo, assim, gentios e judeus na observação do que está por vir.
Chave de Davi é claramente uma alusão a Is 22.22, em que o profeta diz: "Porei sobre o seu ombro [de Eliaquim] a chave da casa de Davi; ele abrirá, e ninguém fechará, fechará, e ninguém abrirá". O texto é messiânico: Jesus, descendente de Davi (22.16), é o Messias, com poder sobre a morte e o inferno (1.18). Vale dizer que isso é crucial para entendermos que não é o diabo que envia as pessoas para o Inferno, mas Deus é Quem determina soberanamente o destino de justos e ímpios.
Segue a fórmula "Conheço as tuas obras", com o acréscimo: "eis que tenho posto diante de ti uma porta aberta, a qual ninguém pode fechar - que tens pouca força, entretanto, guardaste a minha palavra e não negaste o meu nome" (v.8).
O santo e verdadeiro, que detém a chave de Davi, abriu uma porta diante dos irmãos em Filadélfia, e ninguém pode fechar. As pessoas gostam dessa expressão "uma porta aberta". Todo mundo quer uma porta aberta, ninguém aprecia portas fechadas. Já escutei muitas vezes "porta aberta" como sinônimo de "porta de emprego". Creio que isso diminui o peso da palavra dada à igreja em Filadélfia, embora ninguém saiba que porta seria essa. O fato é que as pessoas gostam de portas abertas.
Contudo, aquela igreja tinha pouca força, e em momento decisivo guardou os mandamentos do SENHOR, e não negou o Seu nome. Aquela igreja tinha obediência e integridade, duas coisas que as "igrejas-modelo" de hoje nem sempre destacam como aspectos principais. Dito de outro modo: podem até ser obedientes e íntegras, mas não destacam essas virtudes como fundamentos de seu sucesso. O que se destaca é o crescimento numérico, a capacidade de organização, o envio de missionários, a implantação de outras igrejas, a inserção na sociedade.
Ora, tudo isso é importante, e creio piamente que qualidade gera quantidade: se uma igreja é realmente dinâmica, o crescimento numérico é seu destino natural. No entanto, o primordial numa igreja é seu caráter, ainda que com pouca força, e não seu "impacto" social.
Os irmãos em Filadélfia tinham problemas. Diz o texto: "Eis que farei que alguns dos que são da sinagoga de Satanás, desses que a si mesmos se declaram judeus e não são, mas mentem, eis que os farei vir e prostrar-se aos teus pés e conhecer que eu te amei. Porque guardaste a palavra da minha perseverança, também eu te guardarei da hora da provação que há de vir sobre o mundo inteiro, para experimentar os que habitam sobre a terra" (vv. 9,10).
A expressão "sinagoga de Satanás" e a menção a uns supostos judeus ocorreu antes, na Carta a Esmirna (2.9). O movimento judaizante é antigo, vez por outra quer influenciar a Igreja. E, sem querer fomentar a polêmica, afirmo que esse movimento judaizante percorre igrejas brasileiras com muito vigor em nossos dias, com símbolos estritamente judaicos importados para o culto cristão, e com uma pregação do Antigo Testamento sem entender que o Novo Testamento é espelho e cumprimento do Antigo - Jesus cumpriu a Lei!
Há uma promessa aqui: os judeus impostores iriam se prostrar aos pés dos crentes, considerando que Jesus os amou. Jesus ama a todas as pessoas, boas ou más. Porém, seu amor especial é devotado a quem guarda os Seus mandamentos. É um amor em termos de afinidade, amizade, sentimento de aprovação.
Sobre o versículo 10 parece que criaram certa confusão. Os defensores do Pré-tribulacionismo dizem que a "provação que há de vir sobre o mundo inteiro, para experimentar os que habitam sobre a terra", seria a Grande Tribulação. Aliada a isso, está a noção de que as sete igrejas da Ásia representam sete estágios da Igreja no decurso da História, premissa que coloca Filadélfia e Laodicéia como símbolos da situação final da Igreja, perto da volta de Cristo.
Usando uma gíria - que não é de meu costume - digo que essa interpretação "força a barra". Até se pode argumentar melhor em prol do Pré-tribulacionismo, mas não com base nesse versículo. As igrejas do Apocalipse realmente existiram, não vendo eu motivo para alegorizar onde a Bíblia não permite.
Seguem as promessas: "Venho sem demora. Conserva o que tens, para que ninguém tome a tua coroa. Ao vencedor, fá-lo-ei coluna no santuário do meu Deus, e daí jamais sairá; gravarei também sobre ele o nome do meu Deus, o nome da cidade do meu Deus, a nova Jerusalém que desce do céu, vinda da parte do meu Deus, e o meu novo nome. Quem tem ouvidos, ouça o que o Espírito diz às igrejas".
Em Ap 21.2 temos notícia da Cidade Santa, a Nova Jerusalém, que desce do Céu, "ataviada como noiva adornada para o seu esposo". Embora queira deixar essa reflexão para depois, adianto que a Nova Jerusalém é para mim a própria Igreja de Cristo, e não uma exatamente cidade, pois a indicação é sobre o tabernáculo de Deus com os homens, a morada de Deus (Ap 21.3). Deus mora na Igreja, nos corações dos crentes. O Reino Celestial é prosseguimento cabal e perfeito do que já ocorre em nossos corações enquanto cristãos. Lembremos que a cidade é chamada de noiva, metáfora para a Igreja (Ef 5. 25-27; Ap 22.17).
O nome do santuário de Deus, o nome de Deus e o novo nome de Cristo inscritos no vencedor, agora coluna desse mesmo santuário. Santuário, tabernáculo, cidade, noiva, coluna. Não somos capazes de ver que isso são metáforas? Vale dizer que considerar uma expressão como sendo metafórica não lhe retira a validade, como talvez pensem os literalistas. Pelo contrário, a atitude que atenta contra o texto é aquela de tentar dar um sentido próximo a nós pelo simples fato de não vermos sentido aparente. Além disso, um texto pode ter em sua mensagem não apenas palavras, mas também figuras de linguagem, o sentido conotativo e o denotativo, coisas que não devem ser desprezadas pelo bom hermeneuta.
Portanto, ganharemos muito mais se olharmos a igreja em Filadélfia como igreja real. Todas as sete igrejas do Apocalipse estão vivas hoje pelo mundo afora. Estou certo de que Filadélfia está por aí.
PRIGENT, Pierre. O Apocalipse. São Paulo: Edições Loyola. Tradução Luiz João Baraúna, 2002, 455p.

Estudos no Apocalipse - O cristianismo nominal é antigo (3.1-6)

A igreja em Sardes recebe a Carta de Jesus Cristo, "aquele que tem os sete Espíritos de Deus e as sete estrelas" (v.1).
Não se trata de sete Espíritos literalmente, mas de um Espírito sêxtuplo, ou seja, Perfeito, porque o número sete, na numerologia judaica, indica perfeição. Já anotei isso no estudo Jesus Cristo e Seus atributos (1.4-6).
Jesus é também o que tem as sete estrelas porque Ele foi Quem nomeou os pastores das sete igrejas. O próprio Jesus afirma que as sete estrelas são os sete anjos das igrejas (1.20), que são, como dissemos antes, os respectivos pastores.
Assim, Aquele Jesus glorificado que apareceu a João com as sete estrelas nas mãos (1.16) é o mesmo que tem os sete Espíritos de Deus, que por Sua vez estão diante do trono de Deus (1.4).
A igreja em Sardes não tem muito do que se orgulhar. Jesus diz: "Conheço as tuas obras, que tens nome de que vives e estás morto" (v.1). A palavra é tão direta quanto dura. Sem hesitação nenhuma, Jesus declara o pecado daquela igreja, qual seja, a hipocrisia, o cristianismo nominal.
A igreja em Sardes tinha nome de que vivia, mas estava morta. Ela estava acometida de um grave problema, e parece que o estado já era terminal. De fato, prossegue o texto: "Sê vigilante e consolida o resto que estava para morrer, porque não tenho achado íntegras as tuas obras na presença do meu Deus" v.2). Essas palavras sugerem uma situação tão preocupante que a recomendação era só salvar um resto, porque a maior parte já estaria perdida.
Mesmo assim, Jesus sempre oferece uma possibilidade de esperança: "Lembra-te, pois, do que tens recebido e ouvido, guarda-o e arrepende-te. Porquanto, se não vigiares, virei como ladrão, e não conhecerás de modo algum em que hora virei contra ti" (v.3).
Lembrar, guardar, arrepender-se...A igreja de Sardes conhecia a verdade, mas não se firmava nela. Surge aqui a idéia de inconstância, teimosia e indisciplina por parte de quem sabe p que deve fazer e não faz. Como eles tinham o conhecimento necessário, a falta de disciplina acarretaria um juízo repentino.
Como sói acontecer, havia um remanescente, referido como "umas poucas pessoas que não contaminaram as suas vestiduras e andarão de branco junto comigo, pois são dignas" (v.4).
A promessa ao vencedor liga-se à situação do remanescente. Vejamos: "O vencedor será assim vestido de vestiduras brancas, e de modo nenhum apagarei o seu nome do Livro da Vida; pelo contrário, confessarei o seu nome diante de meu Pai e diante dos seus anjos. Quem tem ouvidos, ouça o que Espírito diz às igrejas" (vv.5,6).
Aquelas poucas pessoas que não contaminaram suas vestes andarão de branco com Jesus, serão vestidas de vestes brancas. A cor branca, no Apocalipse, simboliza a pureza, a justiça. Quem é justo agora será considerado digno de morar no Céu, porque o Céu é lugar de Justiça. Há coerência nisso. Não há um modo de passar por uma espécie de purgatório, um estágio de transição - o Céu e o Inferno são conseqüencias do que somos aqui.
Lembro agora daquele famoso Sermão de JONATHAN EDWARDS, Pecadores nas mãos de um Deus irado. Ele dizia que o Inferno apenas reflete o que há no coração dos ímpios. É isso mesmo. Em contrapartida, o Céu reflete o que Jesus operou pelos salvos no Calvário - atos de Justiça para justificar pecadores.
Outro prêmio para o que vencer será a manutenção do nome no Livro da Vida, assim como a "confissão" do nome do vencedor, pelos lábios de Cristo, diante de Deus e de Seus anjos.
Que interessante! Aquela igreja era nominal, tinha uma fé nominalmente viva e efetivamente morta, mas o resto que ainda vivia teria seu nome confessado por Cristo. Isso não indica uma contraposição entre a confissão meramente nominal da igreja de Sardes e a confissão de Jesus Cristo como prêmio aos verdadeiros crentes? Quero dizer: se a pessoa confessa a Cristo "da boca para fora", Jesus a rejeitará diante do Pai. Essa é uma boa demonstração da Lei da Semeadura.
Também vejo esse contraponto no fato de que o cristão nominal não terá seu nome escrito no Livro da Vida.
É preciso pensar mais sobre o Livro da Vida. Vemos Moisés intercedendo por Israel em Ex 32.30-35 a ponto de pedir a Deus: "perdoa-lhe o pecado; ou, se não, risca-me, peço-te, do livro que escreveste" (v.32). Em Lc 10.20, Jesus diz aos 70 para não se alegrarem demais pelo fato de expulsarem demônios, mas por seus nomes estarem arrolados nos Céus.
Livro da Vida, livro que Deus escreveu, nomes arrolados no Céus - tudo isso está relacionado. Em Ap 13.8, João menciona novamente o Livro da Vida, sendo que aqueles que não tiverem seus nomes ali escritos adorarão a besta (Ap 13.1-10). Ainda em Ap 13.1-10, vemos que se trata do "Livro da Vida do Cordeiro que foi morto desde a fundação do mundo" (v.8).
O Livro da Vida traz a idéia do rol de salvos, associada à dinâmica do plano soberano de Deus, que, longe de ser passivo às atitudes humanas, coordena todo o programa salvífico. Dessa forma, o Livro da Vida é como um documento que, de acordo com certos pressupostos, contém os nomes de quem atendeu ao convite da Salvação. Não se trata de ser predestinado, mas de ter atendido ao plano salvífico tal como delineado por Deus, sem reservas. Afinal, o livre-arbítrio, como premissa geral, foi planejado por Deus. Quando eu decido me tornar cristão pela fé, e guardar os mandamentos divinos, eu na verdade estou me "encaixando" num plano que precede à fundação do mundo.
Para nós fica a solene advertência: a confissão de Jesus Cristo como Salvador e SENHOR precisa repercutir em nossas atitudes. O "nominalismo" é sempre pecaminoso.

Estudos no Apocalipse - Falso profetismo e prostituição, de um lado; mas persiste um remanescente fiel (2.18-29)

Voltando-se à igreja que estava em Tiatira, João apresenta Jesus como "o Filho de Deus, que tem os olhos como chamas de fogo e os pés semelhantes ao bronze polido" (v. 18). Mais uma vez se faz referência à visão de Jesus glorificado, no que toca às figuras de Sua divindade e majestade (1.9-20, esécialmente 14 e 15), mas o apóstolo usa agora a expressão "filho de Deus", em lugar de "filho do homem". João já empregara essa expressão no Evangelho e em sua Primeira Carta, algo que não é comum no Apocalipse.
A Carta começa com a fórmula "conheço as tuas obras..." (v.19), semelhante a outras (2.4, 9, 13, 3.1, 8, 15). Jesus é Aquele que conhece todas as coisas e cada um em particular. Ele é Onisciente. Jesus não lê pensamentos - Ele conhece de antemão, sem recorrer a expedientes adivinhatórios. Jesus é Deus.
O que Jesus elogia em Tiatira? Suas obras, seu amor, sua fé (=fidelidade), seu serviço, sua perseverança e suas últimas obras. Diz ainda que estas obras são maiores que as primeiras, o que contrasta vividamente com o dito de Éfeso em 2.4. Desse modo, é certo que houve um aperfeiçoamento.
No entanto, logo vem o "tenho, porém, contra ti". Nesse caso, o pecado era de tolerância ao pecado de outrem. A advertência foi motivada pela tolerância a uma mulher, que João chama de "Jezabel", a qual "se declara profetisa", e que obtém permissão de ensinar, seduzir os servos de Deus a praticarem a prostituição e a comerem coisas sacrificadas aos ídolos (cf. 2.20).
Certamente o nome Jezabel é uma alusão à terrível mulher de Acabe, que dominou o fraco marido, levou seu paganismo fenício para Israel, matou profetas, perseguiu Elias, comprou testemunhas falsas contra Nabote só para agradar seu caprichoso esposo. Jezabel é aqui sinônimo de impiedade, perversão. Não creio que o nome da tal profetisa fosse mesmo Jezabel.
A mulher declarava-se profetisa, assim como em Éfeso apareceram uns que se diziam apóstolos sem ser (2.2). Todavia, enquanto os efésios identificaram os falsos apóstolos e os acharam mentirosos, o pessoal de Tiatira acabou dando crédito à mulher sedutora. Pensem nisso: na igreja de Tiatira surgiu essa personagem que, com suas blandícias, conseguiu ser reconhecida como profetisa, a ponto de ser aceita como ensinadora!
Há um dado histórico de que o movimento do montanismo dominou a igreja em Tiatira por algum tempo, de 170 d.C. a 263 d.C. (PRIGENT: 2002, p. 67). Tratava-se de um ensino caracterizado por manifestações supostamente carismáticas, dentre as quais o profetismo. Será que João está profetizando sobre a dominação montanista décadas depois? Sou inclinado a supor que essa falsa profetisa já existia ao tempo da escrita do Apocalipse, como todos os problemas mencionados nas Cartas às sete igrejas, embora não duvide de que essa tendência tenha se fortalecido e se sistematizado com o passar dos anos.
Assim como os da doutrina de Balaão em Pérgamo (2.14), Jezabel ensinava a prostituição e a idolatria. Não vejo aqui metáforas: para mim, era prostituição mesmo, era idolatria mesmo.
Talvez fiquemos hoje assustados com o fato de uma mulher enganar uma igreja ou parte dela, mas devemos considerar duas coisas: a) a influência do gnosticismo, presente naquela época sobre igrejas, criou duas situações, que eram a do ascetismo e da libertinagem, ambas a partir da premissa de que a carne, como corpo, deveria ser desprezada - desprezada pelas práticas de abstinência (ascetismo) ou desprezada em termos de "o que se faz com o corpo não interfere na alma" (libertinagem); b) não é verdadeiro afirmar que em igrejas do nosso tempo seja impossível existirem práticas espúrias como as incitadas por "Jezabel", notadamente naqueles lugares em que se levanta um falso profeta reconhecido no grupo. Ouvi relato acerca de um falso líder que praticava relações ilícitas com mulheres da comunidade supostamente cristã. Tudo isso é absurdamente anti-bíblico, e cria estupefação e escândalo, mas não podemos dizer que fosse exclusividade de uma igreja em Tiatira.
Jesus continua suas advertências: lembra que já dera tempo para que a profetisa se arrependesse "da sua prostituição"; afirma que irá prostrar "de cama" e em "grande tribulação" a profetisa e os que com ela adulteram, caso não haja arrependimento (vv. 21,22). Haveria, pois, uma enfermidade enviada por Deus para obter cura ou juízo, dependendo da reação das pessoas envolvidas.
Além disso, Ele diz "matarei os seus filhos, e todos as igrejas conhecerão que eu sou aquele que sonda mentes e corações, e vos darei a cada um segundo as suas obras" (v. 23).
Entretanto, havia ainda um remanescente fiel, "tantos quantos não têm essa doutrina e que não conheceram, como eles dizem, as coisas profundas de Satanás" (v.24). É interessante aqui o uso da figura de linguagem chamada ironia: o texto diz que, segundo os adeptos da profetisa, os outros não conheciam "as coisas profundas de Satanás". Penso que seja uma referência ao fato de que os gnósticos, e as religiões de mistério em geral, dizem a respeito de conhecimentos ocultos, elevados, próprios de um grupo de iniciados, que chegaram a determinados degraus de cognição. Pelo recurso literário da ironia, diz-se aqui que esses conhecimentos são mesmo profundos, mas profundos em Satanás.
Como deve ter sido difícil para os fiéis de Tiatira suportar o pecado de "Jezabel" e a tolerância oficial! O remanescente sempre padece, pois luta contra estruturas. São eles agora conclamados a conservar o que têm, diz Jesus, "até que eu venha" (v. 25).
Segue a promessa: "Ao vencedor, que guardar até ao fim as minhas obras, eu lhe darei autoridade sobre nações, e com cetro de ferro as regerá e as reduzirá a pedaços como se fossem objetos de barro; assim como também eu recebi de meu Pai, dar-lhe-ei ainda a estrela da manhã. Quem tem ouvidos, ouça o que o Espírito diz às igrejas" (vv. 26-29).
Note-se a remissão ao Sl 2.8,9, texto claramente ligado ao Messias - é ao Messias que é concedida autoridade sobre as nações como Sua herança e possessão, para regê-las com vara de ferro e despedaçá-las como a um vaso de oleiro.
Considerando que o que o vencedor receberá é o que Jesus conquistou no Calvário, penso que não se trata de um governo político no futuro, mas afirmação de que o Reino de Deus em Cristo é formado pelos salvos, os que foram feitos filhos de Deus, mas não na condição de súditos, e, sim, de herdeiros. Isso é muito importante: não fomos chamados para servir como súditos no Reino Celestial, embora sejamos servos de Deus - fomos chamados para reinar com Cristo eternamente. A questão não é prometer a nós um governo político sobre o mundo em qualquer época - agora ou num eventual Milênio -, mas prometer que nossa vitória é garantida pela vitória de Cristo, que adquiriu, pela morte, poder sobre todas as coisas.
Por fim, apenas porque considero isso relevante: pensemos na figura de Jezabel com muita seriedade. A figura que exsurge do texto apocalíptico é grave, pois uma falsa profetisa engana parte de uma igreja local, fundamentada provavelmente em sua capacidade verborrágica, e deixa um remanescente aflito. Jamais podemos fundar nossa fé em profecias, nem em quaisquer outros dons carismáticos. Conquanto eu creia em profecias, e as considere necessárias, todas as profecias precisam ser submetidas ao crivo da Palavra de Deus. É certo que o caso de "Jezabel" é bem específico, relacionado que estava a doutrinas pagãs. Mas há o perigo de pessoas menos avisadas saírem atrás de movimentos "proféticos", visitarem mulheres conhecidas por suas profecias, ou de crentes se reunirem, não mais no templo, e sim em casas de supostos profetas, para orações em busca de manifestações carismáticas, sem a supervisão de um pastor. Nessa seara, todo cuidado é pouco.
PRIGENT, Pierre. O Apocalipse. São Paulo: Edições Loyola. Tradução Luiz João Baraúna, 2002, 455p.

segunda-feira, 12 de maio de 2008

Estudos no Apocalipse - Mártires, idólatras e imorais na mesma igreja local (2.12-17)

Jesus apresenta-se aos irmãos de Pérgamo como "aquele que tem a espada afiada de dois gumes". Essa metáfora já foi usada por João em 1.16, na visão do Jesus glorificado. Jesus tem a Palavra que penetra no coração do homem e disseca alma e espírito, pensamentos e intenções (Hb 4.12). É esse Jesus Onisciente que fala a Pérgamo agora.
Havia naquela igreja pontos positivos e negativos: dentre os pontos positivos, havia o fato de que, embora habitando um lugar em que estava "o trono de Satanás", os crentes conservaram o nome de Cristo e não negaram a fé. Naqueles dias morrera Antipas, um mártir, a quem Jesus chama de "minha testemunha, meu fiel". Antipas foi martirizado "onde Satanás habita".
Duas doutrinas, porém, perturbavam os irmãos em Pérgamo: a doutrina de Balaão e a doutrina dos nicolaítas.
A doutrina de Balaão é uma remissão à forma como o profeta Balaão ensinou o rei moabita Balaque a armar ciladas diante dos filhos de Israel, para que comessem coisas sacrificadas aos ídolos e se prostituíssem (ver toda a história em Nm 22-24). Note-se que em At 15.29 a prostituição e o comer alimentos sacrificados aos ídolos são duas das quatro coisas que não deveriam ser praticadas pelos cristãos, de acordo com a decisão do Primeiro Concílio da Igreja, em Jerusalém. Estava mais do que claro que idolatria e relações sexuais ilícitas estavam fora do plano para a Igreja, mas alguns se infiltraram em meio ao povo de Deus e quiseram que houvesse idolatria e prostituição, fazendo disso uma doutrina.
Judas menciona esse ensino libertino em sua pequena Carta, dizendo de alguns falsos irmãos que "se precipitaram no erro de Balaão" (v. 11). Nesse contexto, Judas menciona vícios muito graves, de natureza sexual, introduzidos por falsos líderes no seio de igrejas, a saber: a) transformaram em libertinagem a graça de Deus (v.4); b) contaminaram a própria carne, como Sodoma e Gomorra (vv. 7,8); c) andavam segundo as suas ímpias paixões (v. 16, 18); eram sensuais (v. 19). É isento de dúvidas que um dos mais graves pecados ensinados pelos líderes falsos era a imoralidade sexual, e Judas deixa isso claro.
Parece que o fato se tornou muito importante, pois também Pedro se referiu ao "caminho de Balaão" (II Pe 2.15), e disse que certos líderes tinham "os olhos cheios de adultério", sendo "insaciáveis no pecado, engodando almas inconstantes" (II Pe 2.14).
Assim, três apóstolos - João, Judas e Pedro - escreveram sobre a prática de imoralidade sexual em meio a pessoas que confessavam a fé cristã. E não se tratava somente da prática, mas de alguma teorização e justificativa do erro, porque se chama "doutrina de Balaão".
Além da doutrina de Balaão, havia a doutrina dos nicolaítas, que tem relação com a primeira, pois certo Nicolau ensinara o antinomismo, ou seja, a desnecessidade de apego a regras morais. Enquanto os efésios, com sua ortodoxia, souberam aborrecer as obras dos nicolaítas (2.6), os de Pérgamo não tiveram o mesmo discernimento.´
Registre-se que essas doutrinas imorais não eram pecados de todos os crentes, porque havia "alguns" que disseminavam essas idéias. Mas a advertência foi dirigida à igreja como um todo, dada a tolerância para com o mal. Por isso, se não houvesse arrependimento, o SENHOR iria agir contra eles, por meio da espada de Sua boca, que é justamente a Sua Palavra.
É digno de nota a igreja em Pérgamo parecer tão contraditória: no mesmo lugar em que havia mártires havia libertinos e idólatras. Era de fato uma igreja heterogênea, uma igreja de extremos. Imagina-se que a chamada "Igreja Primitiva" era um modelo ideal de igreja. Ledo engano. Não existe modelo ideal de igreja. O que existe é a Igreja de Cristo, formada por homens e mulheres, todos pecadores encontrados por Cristo, e isso foi o ideal de Deus.
Quando me refiro aos pecados na igreja de Pérgamo, ou de qualquer outra, refiro-me a erros cometidos pelos crentes ou por falsos crentes. No caso de Pérgamo, em especial, havia um grupo sério, de gente capaz de resistir até à morte, mas também havia o grupo dos imorais e dos idólatras - estes, pelo que o texto indica, não eram considerados cristãos pelo apóstolo João, mas, isto isto sim, gente de má-fé, infiltrada, semelhantemente ao que escreveram Pedro e Judas.
Por fim, ao vencedor é prometido o maná escondido, bem como uma pedrinha branca com um nome escrito, o qual somente Jesus e o que o recebe é que podem conhecer. Essa pedrinha branca com o nome escrito em caráter sigiloso denota grande honra e privilégio. O maná é alusão àquele alimento que os israelitas receberam dos céus, quando de sua jornada no deserto, rumo a Canaã (Ex 16.1-10). O maná representa a providência diária concedida gratuitamente por Deus. No Céu, eternamente seremos alimentados pela providência divina. Não me pergunte sobre detalhes do que haverá no Céu, porque eu não sei. Apenas espero comer do maná. O interessante é que tanto o maná é "escondido" como o nome na pedrinha branca é sigiloso. Vejo nisso algo de privilégio exclusivo dos salvos, e de cada salvo.
Só mais uma nota: devemos aprender com a igreja em Pérgamo. Assim como eles, somos igrejas heterogêneas, e há uma decepção generalizada com as instituições eclesiásticas. Muitas pessoas têm se afastado das igrejas, muitas não querem congregar, suspeitam dos líderes, têm receio de um compromisso com uma igreja. E se alguém acha que a Igreja no Brasil está verdadeiramente crescendo, observe, por outro lado, que o compromisso parece diminuir, porque as pessoas andam de igreja em igreja.
De toda maneira, diante desse quadro ruim, não devemos nos delisudir com a Igreja de Cristo, que é vivenciada nas igrejas locais. Para mim é grande motivo de consolo ler a Carta de Jesus Cristo à igreja em Pérgamo. Creio que ela diz muito a todos nós.

Estudos no Apocalipse - Evangelho, pobreza e sofrimento (2.8-11)

É a vez da Igreja na cidade de Esmirna receber a Carta daquele que é "o primeiro e o último, que esteve morto e tornou a viver". João destaca a Eternidade, Soberania e Obra Salvífica de Jesus. O Eterno morreu e tornou a viver.
Os irmãos de Esmirna recebem consolo no sofrimento. Jesus lhes diz ternamente: "Conheço a tua tribulação, a tua pobreza (mas tu és rico) e a blasfêmia dos que a si mesmos se declaram judeus e não são, sendo, antes, sinagoga de Satanás". Essas palavras são em si mesmas motivo de conforto porque Jesus mostra que conhece, que tem ciência do que está acontecendo com os Seus. Deus não está alheio, absolutamente!
Havia tribulação e pobreza em Esmirna, mas também, para piorar, um grupo de judaizantes queria se impor à igreja. Jesus os chama de "Sinagoga de Satanás", o que é um expressão, para mim, das mais terríveis dentre as registradas na Bíblia.
Fica difícil conciliar esse texto com o evangelho triunfalista da Teologia da Prosperidade e da Confissão Positiva, pois estes movimentos pseudo-cristãos ensinam, em geral, que o crente não pode sofrer, não pode adoecer, tem que ficar rico, tem que sair da pobreza, ter que usar a fé como forma de alcançar milagres e livramentos, e que, se houver problemas financeiros e de saúde, isso é por causa do pecado ou de falta de fé. Ao contrário, Jesus elogia os crentes de Esmirna, pois, mesmo sendo pobres e atribulados materialmente, são ricos sob determinada ótica.
Sim, Jesus não diz em momento nenhum que a pobreza seja uma virtude, nem que teria feito Ele uma "opção pelos pobres", como fez a Igreja Romana. Jesus não está elogiando o fato de ser pobre, mas está dizendo que o importante é um outro tipo de riqueza, a riqueza de ser cristão.
Vale discernir os conceitos de pobreza e miséria. Pobreza é o estado de quem possui parcas condições econômicas, enquanto miséria já é uma situação deplorável, que insulta a dignidade humana.
Dou um exemplo: já entrei em muitas casas pobres, conheço lugares pobres, mas certa vez, a pedido de um irmão em Cristo, fui à casa de um irmão dele, que vivia sozinho havia anos na casa que tinha sido dos pais. O homem estava na casa dos cinqüenta, mas o alcoolismo e o estilo de vida o deixaram com um semblante envelhecido. Eu entrei na casa: não se tratava somente de pobreza, mas de miséria. Era como se o ambiente fosse um retrato físico do que havia naquele coração. Lembro-me da cena até hoje, e o que ficou em minha mente foi a ausência de cor. Falei de Jesus para ele, que, no entanto, logo voltou a seu ritual de embriaguez, e poucos dias depois morreu.
Miséria é, pois, bem diferente de pobreza. Os irmãos de Esmirna eram pobres, sim, e isso em nada desdoura a sua dignidade.
Davi disse num salmo que nunca viu o justo mendigar o pão, nem a sua descendência padecer necessidade, mas não disse que nunca viu um justo pobre.
Agur disse que não quer a pobreza, para não vir a roubar, nem a riqueza, para que não se esqueça de Deus - ele prefere ficar no meio-termo, mas o uso da palavra "pobreza" nesse trecho tem o sentido de não ter nem o básico para sobreviver, o que se aproxima do conceito de miséria (Pv 30.7-9).
Jesus e a maioria dos apóstolos eram pobres. A Igreja começou com gente pobre, e não se diga que através dos séculos a Igreja ficou rica. Instituições eclesiásticas podem ter-se enriquecido, mas os cristãos geralmente são menos abastados.
Nem a pobreza é garantia de humildade nem a riqueza é sinônimo de usura e ambição. Os ricos são tentados à opulência, desperdício e materialismo, mas Jesus pode salvá-los (Lc 18.26,27; Tg 5.1-6; I Tm 6.17-19; ver Lc 18.18-30 e os textos paralelos em Mateus e Marcos sobre o jovem rico que se encontrou com Jesus e preferiu suas riquezas; ver também Lc 19.1-10, quando Zaqueu, rico, encontra Jesus e é salvo).
Além de receberem o conforto de Jesus, quanto à ciência que Ele tem de seu sofrimento, os irmãos de Esmirma ouvem um "não temas". É certo que o diabo lançaria alguns deles na prisão, "para serdes postos à prova", com uma tribulação de 10 dias. Mas aqui vem uma grande promessa: "Sê fiel até à morte, e dar-te-ei a coroa da vida. Quem tem ouvidos, ouça o que o Espírito diz às igrejas: O vencedor de nenhum modo sofrerá dano da segunda morte".
Note-se que Jesus indica a autoria da prisão: o diabo, e não as autoridades romanas, seria o responsável pela perseguição. Ora, se por um lado devemos parar de superestimar o trabalho do diabo, vendo-o onde ele não está, por outro lado precisamos ter discernimento suficiente para compreender que algumas coisas têm a participação dele, sim. Nossa luta é espiritual, acima de tudo.
Aqueles irmãos receberam uma profecia difícil de ouvir: alguns seriam presos, a perseguição seria por dez dias. Mas, de toda maneira, aqui nessa fixação de prazo há também consolo, pois dizem que o pior da tortura é não saber quando vai acabar, não saber se este é o último dia ou não.
Justamente àqueles que estavam sofrendo, com ameaça de morte, Jesus fala de vida, de vitória sobre a morte, de não passar pela segunda morte. É nítido esse contraste: a) Jesus morreu, mas ressuscitou; b) os fiéis até à morte receberão a coroa da vida; c) o vencedor - sobre pobreza, sofrimento, judaizantes, prisões... - não sofrerá o dano da segunda morte.
Esse Evangelho que sabe lidar com pobreza e sofrimento foi o Evangelho que eu recebi quando ainda criança. A mensagem da Cruz nada tem que ver com as superficiais e anti-bíblicas pregações "de vitória" que temos ouvido freqüentemente.
Seria bom atentarmos um pouco mais para a Carta à Igreja de Esmirna.

sexta-feira, 9 de maio de 2008

Estudos no Apocalipse - O abandono do primeiro amor (2.1-7)

A igreja em Éfeso, por meio de seu anjo (pastor), é a primeira igreja a receber sua Carta enviada por de Jesus Cristo pelas mãos de João. Jesus diz que conhece suas obras, tanto o seu "labor" como a sua "perseverança"; que não pode ela suportar "homens maus"; que ela pôs à prova "os que a si mesmos se declaram apóstolos e não são"; que a igreja considerou que esses pretensos apóstolos eram "mentirosos". Jesus repete o elogio à perseverança dos efésios, ante o fato de terem suportado provas por causa do Seu nome, e porque não se deixaram "esmorecer". Tudo isso são elogios.
Entretanto, há uma exortação muito dura, que vem introduzida pela frase "Tenho, porém, contra ti" (v. 4), repetida quanto a algumas outras igrejas.
O que estava errado em Éfeso? Eles abandonaram o seu primeiro amor. Eram ortodoxos, perseverantes, trabalhadores, conheciam o zelo e a disciplina, mas já não amavam tanto ao SENHOR como antes. Por isso, precisariam adotar alguns passos: a) lembrar onde caíram; b) arrepender-se; c) voltar à prática das primeiras obras. Do contrário, seu candeeiro seria removido por Jesus. O candeeiro, como visto anteriormente, representa cada uma das igrejas da Ásia Menor. Se os efésios não voltassem ao primeiro amor, seriam despejados de seu status de igreja.
Estamos diante de um pecado coletivo. Aliás, todas as igrejas a que João escreveu em Apocalipse recebem palavras de cunho predominantemente coletivo, com algumas observações particulares. A igreja de Éfeso está sendo agora contemplada em seu conjunto, e, como corpo, falhou em algum momento, deixando de amar a Deus como em seu início.
Éfeso foi uma igreja privilegiada. O apóstolo Paulo exercera naquela cidade boa parte de seu ministério (At 18.18-19.20). Áquila e Priscila foram deixados por Paulo em Éfeso quando de sua segunda viagem missionária (At 18.18,19); o eloqüente pregador Apolo passou por lá (At 18.24-28); foi lá que, sob as mãos de Paulo, pessoas foram batizadas no Espírito Santo (At 19.1-7), e tantas outras foram curadas ou libertas de espíritos imundos ou práticas de magia, havendo "milagres extraordinários" (At 19.11). Paulo ensinou na sinagoga deles por três meses, e na escola de Tirano por dois anos, de modo que Éfeso se tornou centro de irradiação do Evangelho por toda a Ásia (At 19.8-20). Mesmo sem poder voltar a Éfeso, Paulo chamou seus presbíteros a Mileto e lhes deu uma solene e especial palavra de despedida, que até hoje fala profundamente aos pastores e à Igreja (At 20.17-38). Além disso, o pastor Timóteo foi enviado por Paulo aos efésios, a fim de coibir doutrinas errôneas (I Tm 1.3). Na cidade de Éfeso, Paulo lutou com feras (I Co 15.32). Há a tradição de que o próprio João pregou em Éfeso.
Foi para essa igreja que Paulo escreveu a Epístola aos Efésios - o nome o indica...Trata-se de uma Carta repleta de ensinos cristológicos e eclesiológicos, de suma importância para o estudo de Cristo e da Igreja, portanto.
Dessa forma, sabemos que muito foi dado à igreja em Éfeso. Segundo um princípio estabelecido por Jesus, a quem muito for dado, muito será exigido (Lc 12.48).
Paulo, Apolo, Timóteo e João dedicaram algum tempo àquela igreja. Eles receberam uma Epístola paulina; muitas obras divinas foram feitas naquele cenário. No entanto, o amor esfriou, o amor foi abandonado.
O que se pode dizer de uma igreja nessa situação? Temos deparado com isso em nossos dias? Uma igreja ortodoxa, que sabe identificar e refrear falsos apóstolos; uma igreja operosa; uma igreja que já sofreu ou sofre por Cristo; uma igreja que tem história - mas que perdeu seu afeto por Jesus Cristo, que vive somente do passado, que já não vibra com a Palavra do SENHOR.
O que vemos hoje? Há aquelas igrejas que sequer sabem identificar falsos apóstolos, eis que têm surgido abundantemente homens se autopromovendo a apóstolos, julgando-se, quem sabe, próximos aos Doze. Se essas igrejas não sabem refrear comportamentos estranhos de líderes vaidosos, o que se dirá do amor a Cristo?
A palavra é dura, mas precisa ser observada: a quem muito for dado, muito será cobrado. Pensemos nisso, e não nos apoiemos simplesmente na adequação doutrinária de nossos credos e confissões, tampouco em nossa bela história e tradição - amemos a Cristo.
A Carta prossegue: a igreja em Éfeso tinha ainda outro aspecto positivo, além dos citados nos vv. 2 e 3. Ela foi elogiada por Jesus pelo fato de odiar as obras dos nicolaítas, obras que Ele também odeia. Os nicolaítas pregavam uma espécie de antinomismo, ensinando que a liberdade cristã afasta as exigências éticas. Eram liberais. Portanto, os efésios estavam certos em aborrecer as práticas dos nicolaítas.
É valioso afastar-se daquilo que Jesus não aprecia. Na verdade, Jesus odiava as obras dos nicolaítas. Isso mostra que devemos "comprar as brigas" que Jesus comprou. Lutar por causas legítimas é agradável aos olhos de Cristo.
As Cartas às sete igrejas terminam com um "quem tem ouvidos, ouça o que o Espírito diz às igrejas" (nesse caso, v. 7). Por isso, como eu tenho ouvidos, não posso me furtar ao que foi escrito às igrejas da Ásia, uma vez que a mensagem serve a todos nós como advertência e promessa.
A promessa dita à igreja de Éfeso, e que estende a todos os cristãos, é de que o que vencer se alimentará da "árvore da vida que se encontra no paraíso de Deus" (v.7). Assim como havia a árvore da vida no Jardim, no Éden (Gn 2.7), os vencedores comerão de seu fruto (Ap 22.2).
Adão e Eva, depois da Queda, foram expulsos do Jardim para não comerem daquela árvore, a fim de não alcançarem a vida eterna. A vitória obtida por Jesus Cristo no Calvário garante ao salvo a vida eterna. Essa é a promessa maior, o fundamento de nossa esperança.


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Um dos terríveis problemas da Igreja evangélica brasileira é a falta de conhecimento da Bíblia como um sistema coerente de princípios, promessas e relatos que apontam para Cristo como Criador, Sustentador e Salvador. Em vez disso, prega-se um "jesus" diminuído, porque criado à imagem de seus idealizadores, e que faz uso de textos bíblicos isolados, como se fossem amuletos, peças mágicas a serem usadas ao bel-talante do indivíduo.

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Bases de Fé

Creio:
Em um só Deus e na Trindade.
Na inspiração verbal da Bíblia Sagrada, única regra infalível de fé normativa para a vida e o caráter cristão.
Na concepção virginal de Jesus, em sua morte vicária e expiatória, em sua ressurreição corporal e sua ascensão aos céus.
Na pecaminosidade do homem, e que somente o arrependimento e a fé na obra expiatória e redentora de Jesus Cristo é que pode salvá-lo.
Na necessidade absoluta do novo nascimento pela fé em Cristo e pelo poder atuante do Espírito Santo e da Palavra de Deus, para tornar o homem digno do Reino dos Céus.
No perdão dos pecados, na salvação presente e perfeita e na eterna justificação da alma recebidos gratuitamente de Deus pela fé no sacrifício efetuado por Jesus Cristo em nosso favor.
No batismo bíblico em águas, em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo, conforme determinou o Senhor Jesus Cristo.
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No batismo bíblico no Espírito Santo que nos é dado por Deus mediante a intercessão de Cristo.
Na atualidade dos dons espirituais distribuídos pelo Espírito Santo à Igreja para sua edificação, conforme a sua soberana vontade.
Na Segunda Vinda de Cristo.
Que todos os cristãos comparecerão ante o Tribunal de Cristo.
No juízo vindouro que recompensará os fiéis e condenará os infiéis.
E na vida eterna para os fiéis e morte eterna para os infiéis.