Fala-se muito hoje em crescimento de igreja. Fala-se em crescimento explosivo, estratégias para o crescimento, "dez passos" para o crescimento... O crescimento da igreja é visto como uma necessidade e um indicativo de sucesso ministerial. Usam-se métodos mais ou menos novos, como as células, o G-12, a tal "igreja com propósitos", e métodos mais antigos, como as cruzadas evangelísticas. Os menos ortodoxos prometem mundos e fundos, como curas, milagres, prosperidade, "descarrego", imunização à dengue (!), a tal da "restituição"...
Cabe aqui o velho e bom questionamento da motivação: para que a gente quer que a igreja cresça? Para que nós sejamos admirados pelos homens? Para que tenhamos poder sobre um maior número de pessoas? Para que todos vejam como nós somos competentes?
Não sou contra o crescimento. Eu quero que a Igreja cresça. Eu preciso querer que a Igreja cresça, pois, se quero que pessoas sejam salvas, logo eu estou querendo que a Igreja cresça, porque ela é composta de salvos. No entanto, perceba que eu escrevi "Igreja" com letra maiúscula.
Sim, em primeiro lugar eu quero que a Igreja de Cristo cresça, independentemente de denominações, grupos, ministérios, lideranças. Eu quero que a Igreja triunfe.
Naturalmente eu quero que a igreja local cresça, mas sob o princípio geral de que a igreja local participa da Igreja de Cristo. Se eu não tiver essa compreensão, haverá problemas.
De fato, querendo que a minha igreja cresça, mas sem uma noção adequada de eclesiologia, eu poderei incorrer em diversos erros, como transigir com doutrinas bíblicas fundamentais, vilipendiar a minha consciência, exaltar métodos e estratégias sem me preocupar com a pessoa humana, dividir a Igreja de Cristo na ânsia de aumentar um rebanho, fazer alianças promíscuas com políticos oportunistas, e explorar os irmãos financeiramente.
É certo que não basta uma boa noção de eclesiologia - é preciso temer a Deus.
Em Atos dos Apóstolos, uma das coisas extraordinárias que Lucas registra é o crescimento do número de discípulos. Ele faz questão de narrar como a Igreja foi crescendo: no Dia de Pentecostes, quase três mil pessoas aceitaram a palavra e foram batizadas (At 2.41), quando a quantidade de discípulos orando no Cenáculo antes disso, naquele mesmo dia, girava em torno de cento e vinte (At 1.15); com a cura de um coxo na porta do Templo, em Jerusalém, e a pregação apostólica, houve um acréscimo para quase cinco mil pessoas (At 4.4); nesse ínterim, "acrescentava o Senhor, dia a dia, os que iam sendo salvos" (At 2.47); os apóstolos encheram Jerusalém com a doutrina de Cristo (At 5.28); multiplicou-se o número de discípulos (At 6.1); multidões na cidade de Samaria aderiram a Jesus Cristo (At 8.4-8,14-25); depois da perseguição desencadeada com a morte de Estêvão, muitos gregos, ouvindo o Evangelho, "se converteram ao Senhor" (At 11.21).
Em At 6.7, parece que temos uma síntese lucana desse crescimento: "Crescia a palavra de Deus, e, em Jerusalém, se multiplicava o número dos discípulos; também muitíssimos sacerdotes obedeciam à fé".
Em At 9.31, outra síntese, agora com abrangência maior: "A igreja, na verdade, tinha paz por toda a Judéia, Galiléia e Samaria, edificando-se e caminhando no temor do Senhor, e, no conforto do Espírito Santo, crescia em número".
Note-se, porém, que Atos dos Apóstolos tem como objetivo mostrar a expansão do Evangelho sob o poder do Espírito Santo, o que está resumido em At 1.8. Lucas não pretende dizer que o crescimento numérico é indicativo de qualidade, mas que a pregação da Palavra de Deus sob a direção do Espírito de Deus produz crescimento.
Não gosto de pensar apenas em números, mas em pessoas. Quando a igreja trabalha com números, não lhe importa, por exemplo, quem são os 3000. Se esse número atinge a expectativa, considera-se exitosa a atividade da igreja, ainda que 1000 almas tenham-se desviado no meio do caminho, e substituídas por outras 1000. E não quero dizer com isso: "Oh, poderíamos ser 4000", porque continuaríamos trabalhando só com números. A questão reside no fato de que 1000 pessoas são 1000 vidas para Jesus Cristo, e pronto.
O ambiente nos capítulos 2 a 5 de Atos é de avivamento, o que envolveu o derramamento do Espírito Santo, curas, milagres, pregações fervorosas e evangelização. Temos um grande alcance de almas em At 8, com batismo de muitos samaritanos no Espírito Santo, evento que se repete em dois grupos menores - At 10 (Casa de Cornélio) e At 19 (doze efésios).
Nos capítulos 13 a 28, temos praticamente uma redução ao trabalho missionário de Paulo, com ênfase na pregação a gentios e na exposição da Salvação pela Graça, e não pelas Obras da Lei. Aqui já não se fala de grandes quantidades de pessoas aderindo à fé, mas de grandes obstáculos derrubados (ignorância gentílica e legalismo judaico). Episódios de "crescimento de igreja" ficaram restritos aos textos que mencionei acima.
Da mesma forma, nas Epístolas não existe o tema "crescimento de igreja", mas "crescimento do crente". Paulo, Pedro, Judas, Tiago e João não escreveram sobre as maneiras de uma igreja crescer. Mas escreveram sobre o novo nascimento, o crescimento, o amadurecimento, o aperfeiçoamento do cristão, a batalha pela fé e a preservação da verdade evangélica.
As igrejas a que Paulo escreveu certamente não eram grandes. Bom, mesmo sendo difícil dizer o que seria grande ou pequeno naquela época, o certo é que as igrejas neotestamentárias eram comunidades em que as pessoas se conheciam e conheciam os seus pastores, sendo conhecidas por estes. Textos epistolares dão indicações nesse sentido.
Quanto à Igreja evangélica brasileira, dizem que ela está crescendo, que soma cerca de 35 milhões de pessoas dizendo-se evangélicas. Se isso for procedente, estou ainda mais preocupado, pois, num País de menos de 200 milhões de habitantes, 35 milhões estão fazendo pouca diferença...para melhor.
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