Depois que três jovens do Morro da Providência, no Rio, foram entregues por militares a traficantes do Morro da Mineira - o que culminou com a morte dos três rapazes, com 46 tiros -, alguns têm dito que isso faz lembrar o Regime Militar, que a culpa é do Exército, que o episódio tem que ver com a inabilidade das Forças Armadas para o policiamento. A jornalista Eliane Cantanhêde, da Folha de São Paulo, chegou a escrever, e dizer num videocast, que a culpa é também da AMAN (Academia Militar das Agulhas Negras) por ter formado o tenente responsável pelo crime...
Não posso concordar com isso. Ao ler o artigo da colunista no "site" www.folha.com.br, enviei-lhe um e-mail, que ela respondeu gentilmente. Agora, acabo de assistir ao seu videocast, que vai no mesmo sentido, e resolvi deixar registrado aqui o meu pensamento.
Vamos aos fatos: o Exército foi ao Morro da Providência para trabalhar no tal projeto "Cimento Social", idéia do senador e candidato a prefeito do Rio Marcelo Crivella, aliado do presidente Lula. Crivella pediu e Lula ordenou a ida do Exército ao morro. Os militares foram maquiar casinhas pobres e fazer o policiamento em torno das obras. Nenhuma dessas tarefas constitui sua missão institucional, mas ele atendeu a ordens superiores porque a hierarquia e a disciplina são as suas bases.
O curioso é que o Ministro da Justiça, Tarso Genro, vem a público dizer que não concorda com o emprego das Forças Armadas na segurança pública. Sim, eu concordo com ele, pois, embora as Forças Armadas devam assegurar a lei e a ordem, isso não pode ser feito sem o cumprimento de certos requisitos, como o pedido do Governador dizendo que não tem mais o controle da criminalidade. Mas eu pergunto: não foi Lula, chefe do Tarso Genro, quem deu a ordem para os militares subirem o morro?
Eu creio que discutir o papel das Forças Armadas como polícia é desviar o foco do problema, eis que o Exército estava fazendo um trabalho de cunho social, motivado por fins políticos, sendo que o policiamento veio secundando esse trabalho.
Vale dizer ainda que o que o tenente fez, com o auxílio de três sargentos e sete soldados, foi por conta própria, e não pode nos remeter aos anos de Ditadura Militar. Se ele é um oficial, formado na AMAN, será que podemos culpar a AMAN pelo ocorrido? Entendo que não. Ele tem responsabilidade individual porque não trabalhou em nome da instituição. Aquele tenente fez algo totalmente diverso do que o Exército deve fazer. Não consigo compreender como alguém faz relação entre esse crime terrível e a atuação das Forças Armadas.
Responsabilizar o Exército pelo que esses militares fizeram é como responsabilizar os pais pelo que seus filhos adultos fazem. É como responsabilizar a escola pelo que o ex-aluno, agora adulto, faz. Recordo do que escreveu o profeta: "Que tendes vós, vós que, acerca da terra de Israel, proferis este provérbio, dizendo: Os pais comeram uvas verdes, e os dentes dos filhos é que se embotaram?" (Ez 18.2). Ora, se os dentes dos filhos estão embotados, eles é que comeram uvas verdes, e não seus pais.
A lembrança recalcitrante do Regime Militar faz com que jornalistas relacionem atos covardes de certos militares a horrores daqueles período. Entretanto, como eu escrevi à jornalista Eliane Cantanhêde, civis também participaram daquele Regime. O problema não são os militares, mas a sociedade eticamente deplorável em que vivemos.
Obs.: o artigo da jornalista Eliane Cantanhêde está em
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