"Ester cumpria o mandado de Mordecai como quando a criava" (Et 2.20).
Dentre tantas lições que o Livro de Ester pode nos oferecer, observo a obediência da personagem-título a seu primo Mordecai, que a criara como se fora sua filha.
O texto em destaque refere-se a Ester já adulta e recém-casada com o rei do império medo-persa.
Desde o casamento com o rei até a maneira como lidar com a ameaça de perseguição aos judeus, Ester foi orientada por seu "pai de criação". Ela nada fazia sem conversar com ele, sem atender às suas palavras.
Sabemos que o Livro de Ester trata da providência divina em favor do povo judeu num momento difícil. Mas não podemos negar que essa mesma providência se deu por meio de uma família, por meio da obediência de uma filha àquele que a criara.
Isso fica sintetizado em 4.13,14, quando, diante da hesitação da moça, Mordecai sugere que sua elevação a rainha poderia ser ato da mão de Deus, para aquela conjuntura especial em que o povo precisava de livramento. Deus agiu no coração do homem, e ele orientou sua filha adotiva. O resultado foi um emblemático livramento dos judeus, que entrou para a História da Salvação, pois Jesus Cristo nasceu dentre os judeus.
Não estou dizendo, com isso, que os pais devam dirigir as vidas de seus filhos adultos, nem intervir na condução dos casamentos alheios. Uma vez emancipado, uma vez independente, o indivíduo deve comandar a sua própria vida e a família que porventura tenha constituído (Gn 2.24; Ef 5.31; ver ainda Gl 4.2). No entanto, essa obediência devotada por Ester a Mordecai exemplifica a atitude dos que honram a seus pais e atendem aos seus sábios conselhos mesmo na vida adulta.
Veja-se que Ester casou sob orientação do pai adotivo, o que para ela foi uma decisão importante para o resto de seus dias. Depois, o Livro não diz que Mordecai ficou se intrometendo na vida do casal, mas que, quando surgiu a ameaça de perseguição, ele, com sua experiência, a aconselhou em casa passo, e ela o ouviu.
Quão diferente o comportamento de Ester em relação ao que se vê em nossa sociedade hoje! A autoridade familiar está em perigo. Muitos filhos querem independência quando ainda adolescentes. Muitos não dedicam a seus pais a necessária obediência hierárquica. Muitos pais não têm "voz de comando" (para usar uma expressão da Super Nanny). Muitos pais são ausentes.
Tenho para mim que o princípio sócio-político da autoridade sempre deriva do conceito de autoridade que se tem em casa. As autoridades civis e escolares terão o mesmo tratamento que os filhos deram a seus pais quando sob o poder familiar. É por isso que nossa sociedade vive uma crise de autoridade: não se respeitam as leis, os fiscais de trânsito, os fiscais sanitários, os fiscais das prefeituras, os policiais, os governantes, o direito, enfim, todo o conjunto de normas jurídicas e de pessoas investidas de poder social.
Voltando ao exemplo de Ester, pelo menos a Igreja deve dar o exemplo, pois se trata de obedecer a Deus. Não tenho nenhuma dúvida de que Et 2.20 não foi inserido por acaso nas páginas da Escritura.
Deus aprecia o respeito aos pais, que não deixam de o ser só porque nós crescemos.
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