Na prática, as igrejas pentecostais enfatizam demasiadamente a ação carismática do Espírito Santo em detrimento da mensagem da Cruz. Eu sou membro de igreja pentecostal, sei do que estou tratando, e não me importo em fazer essa constatação, porque é real. Se isso não ocorre em teoria, ao menos se mostra como realidade no cotidiano das igrejas dessa linha teológico-doutrinária.
Batismo no Espírito Santo, glossolalia, curas e milagres são a ênfase do Movimento Pentecostal. Valorizam-se as pessoas dotadas de dons espirituais, até mesmo com certo desprestígio àqueles que nunca falaram em línguas. Admito que parte da explicação para esse fenômeno resida no fato de que o avivamento pentecostal despertou igrejas contra o tradicionalismo que olvidava a atuação poderosa do Espírito, chamando a atenção para a doutrina da Terceira Pessoa da Trindade numa perspectiva diferente daquela que inspirava as igrejas históricas. No entanto, ressalvado esse aspecto histórico, o fundamento do kerygma evangélico deve ser sempre a anunciação dos eventos salvíficos em Cristo.
O que estou dizendo não desmerece a Pessoa e Obra do Espírito, mas enxerga a Pneumatologia sob a ótica do Plano de Salvação. Com efeito, em Suas derradeiras lições aos discípulos, o SENHOR Jesus Cristo deixou clara a natureza da missão do Espírito Santo na Igreja:
a) enviado pelo Pai mediante a intercessão do Filho, o Espírito viria como "outro Consolador", em sucessão à presença física de Cristo, a fim de estar "para sempre" conosco (Jo 14.16);
b) Ele é o Espírito da verdade, exclusivo à Igreja, habitando conosco e estando em nós (Jo 14.17);
c) o Espírito viria em nome do Filho para ensinar à Igreja todas as coisas, lembrando aos apóstolos o que Jesus lhes ensinara (Jo 14.26);
d) o Espírito viria para dar testemunho do Filho (Jo 15.26);
e) o envio do Espírito ou Consolador estaria intrinsecamente ligado à Ascensão do Filho e sua ausência (física) por um tempo (Jo 16.7);
f) o Espírito viria para convencer o mundo do pecado, da justiça e do juízo, sendo que o convencimento acerca da justiça seria necessário ante a ausência (física) do Filho (Jo 16.8-11);
g) o Espírito da verdade viria para guiar a Igreja a toda a verdade, não falaria de Si mesmo, dizendo tudo o que tinha ouvido, e anunciando as coisas que haveriam de vir (Jo 16.13);
h) o Espírito da verdade glorificaria o Filho, tendo recebido do que é do Filho para anunciar à Igreja (Jo 16.14).
Todas essas frases estão no futuro do pretérito porque me reporto às palavras de Jesus, mas já tiveram seu cumprimento segundo At 2.1-4.
É muito importante observar que a atividade do Espírito no coração do pecador tem em vista a persuasão a respeito do sacrifício de Cristo, vicário e expiatório. O que o Espírito faz é convencer o pecador dos méritos de Cristo, guiá-lo a toda a verdade, ensinar-lhe as palavras de Cristo, lembrar a Igreja das coisas necessárias, habitar no coração do crente e, com isso, efetuar toda consolação de que esta necessita nesses dias que antecedem a Segunda Vinda do Filho de Deus.
A dotação de poder à Igreja, na forma de dons espirituais, é, sim, muito importante, e tem base bíblica (Lc 24.49; At 1.5; 2.1-4; 4.31; 6.8; 8.6-8, 14-19; 10.44-47; 19.1-7; I Co 2.4,5; 12.1-7). Também é de grande importância o fruto do Espírito (Gl 5.22,23), o encher-se do Espírito (Ef 5.18), para que o crente não seja carnal nem infrutífero, mas amadurecido. Entretanto, todas essas atuações do Espírito devem estar devidamente relacionadas, na mente do cristão, à Obra Salvífica de Jesus Cristo.
O amor de Deus foi derramado em nossos corações pelo Espírito Santo que nos foi dado (Rm 5.5).
Todos os crentes em Cristo foram selados pelo Espírito de Deus para o Dia da Redenção (Ef 4.30).
Todos nós cristãos temos "as primícias do Espírito" (Rm 8.23), o que nos torna seguros de que o Filho um Dia virá nos buscar para Sua augusta e santa presença.
É por tudo isso que, tecnicamente, não é correto orar ao Espírito nem glorificar ao Espírito: a oração é dirigida ao Pai em nome de Jesus, com a intercessão do Espírito por nós, à vista de nossas fraquezas (Rm 8.26,27).
Portanto, precisamos compreender as coisas direito, valorizando imensamente a ação carismática do Espírito, mas conhecendo Seu papel no contexto maior da Salvação.
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